São Miguel: pagamentos atrasados e queda de braço com o governo municipal

Os funcionários da empresa de ônibus São Miguel, concessionária de transporte público de Resende, começaram a receber na manhã desta quarta-feira, dia 21, o pagamento dos vales alimentação que estavam atrasados, na sede da empresa, e retornaram às atividades após paralisação realizada durante a tarde desta terça-feira, dia 20.

O pagamento do benefício acontece um dia após o episódio envolvendo a iniciativa de alguns motoristas da concessionária de paralisar as atividades em protesto ao atraso de salários e outros benefícios. A iniciativa provocou a demissão por justa causa de um dos funcionários, também na terça-feira. O procedimento adotado pela empresa gerou revolta nas redes sociais, tanto dos familiares quanto de outros usuários.

– Gente, estou indignada… Meu pai há anos trabalha na São Miguel, quem o conhece sabe… A dedicação, o compromisso que sempre teve!! E agora levar justa causa por uma paralisação feita pra reivindicar os direitos? O povo trabalhando sem receber e ainda ser mandado embora por justa causa? Essa São Miguel está de sacanagem não é possível! – desabafou uma familiar do funcionário, em um grupo.

Um morador também mostrou sua indignação contra a empresa. “Uma vergonha uma empresa desta sem credibilidade no mercado, teve ônibus apreendido pela justiça, não pagar funcionária em suas filiais, e ainda ameaçar a justa causa, em um pai de família, sendo que o contrato já foi encerrado, já era pra ir embora e ainda insiste de rodar em Resende. (…) Cadê o poder judiciário desta comarca com Ministério Público que não faz jus, a esse ato? Será que o gerente que ganha aí 10 mil por mês vai ter seu salário atrasado? Acha que ele ficará preocupado se atrasar seu pagamento?”, citou em sua postagem.

O comunicado da empresa assinala que o funcionário teve o contrato de trabalho rescindido ao “incitar, convocar e participar de paralisação ilegal do transporte coletivo de Resende, não orquestrada pelo sindicato da categoria, mesmo diante da terrível situação vivenciada pela epidemia do Covid-19”.

A demissão expõe os problemas que a São Miguel vêm enfrentando há algum tempo no município. Deixar de pagar os salários e outros benefícios aos funcionários tem virado rotina para a empresa. O gerente alega que a concessionária – assim como outras que prestam o mesmo tipo de serviço em todo o país – vem sofrendo os efeitos da pandemia.

— Estamos sofrendo com a queda das receitas e o aumento dos combustíveis, sendo que a empresa está com grandes dificuldades para cumprir com suas obrigações. Tanto que o problema agora foi pagar o vale alimentação, que estava programado para hoje (terça-feira, dia 20) e não conseguimos fazer no prazo – disse o gerente da concessionária, Rodrigo Camargos.

A manifestação dos motoristas na terça pegou tanto o gerente quanto o diretor social da subsede de Resende do Sindicato dos Trabalhadores em Transportes Rodoviários de Barra Mansa, Laurimiro Cordeiro de Souza, o Mineiro. Segundo o representante sindical, a iniciativa de paralisar as atividades causou estranheza também no sindicato. Ele relembrou que no começo do mês, motoristas, cobradores e outros trabalhadores da São Miguel ameaçaram parar de trabalhar devido ao não pagamento de todo o salário no último dia 6.

– Fui atrás do Rodrigo, que nos informou que teria havido um problema para efetivar o pagamento dos 40% restantes da remuneração, mas que isso seria resolvido na segunda-feira seguinte (dia 12), depois disso nenhum funcionário denunciou problemas no pagamento, geralmente eles nos comunicam quanto tem alguma coisa errada. E agora não fiquei sabendo de nada – disse Mineiro.

A tentativa de promover uma paralisação das atividades em Resende mostra que os funcionários, por mais que tenham um sindicato que as representa nas convenções coletivas, vêm sofrendo cada vez mais com a piora significativa da situação que passa a concessionária, que coincide também com uma queda de braço entre a São Miguel e o atual governo municipal.

Tudo começou no início do ano de 2017, quando começou a vigorar o decreto do prefeito anterior, José Rechuan Júnior, que aumentou a tarifa do transporte público de R$ 3,40 para R$ 3,80. No entanto, no mês de novembro daquele ano, logo após a aprovação do aumento pelo Conselho Municipal de Trânsito (Comutran), o atual prefeito Diogo Balieiro havia afirmado na ocasião “que tomaria todas as providências para revogar o que considerou ‘absurdo’” e revogar o aumento da tarifa (). A São Miguel recorreu e entrou na justiça contra a recusa do prefeito e acabou levando a melhor. O decreto de Balieiro contra o reajuste da tarifa teve vida curta porque não revogou a medida aprovada por José Rechuan.

O governo do prefeito chegou a anunciar que agiria com maior rigor na fiscalização dos serviços da concessionária com a criação de um decreto de forma equivocada, mas o trabalho e a prestação de serviço da São Miguel seguem sendo criticados. Entre os anos de 2017 e 2018, quando a Câmara promoveu algumas audiências públicas (em maio e dezembro de 2017), o prefeito deixou de comparecer a todas elas, mesmo quando a prefeitura decidiu por fazer outra audiência, em fevereiro do ano passado.

Em todos esses encontros, a população mostrou a insatisfação com o valor da passagem e a qualidade da empresa. Com a pandemia do coronavírus, já com o documento sobre o processo licitatório de escolha da nova concessão, a Prefeitura de Resende marcou o evento para julho, o Tribunal de Contas do Estado (TCE-RJ) suspendeu o processo, baseado em uma representação da São Miguel, por “supostas irregularidades cometidas pelo Poder Executivo no edital de concorrência pública”.

No mesmo mês, a decisão foi anulada pelo Ministério Público do Rio de Janeiro (MPRJ). Segundo informações da imprensa regional, o órgão foi contrário ao voto do tribunal e apontou que o edital lançado pela prefeitura “atendeu todos os requisitos legais e deverá ter andamento normal de agora em diante”. Em setembro o Ministério Público deu parecer contrário a empresa, que queria a suspensão da concorrência pública para a escolha da concessionária que prestará o serviço para Resende nos próximos 20 anos.

Até o momento não há previsão de quando o processo licitatório acontecerá, e a São Miguel segue prestando o serviço em Resende.

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