O mês que pintaram de amarelo

Hoje é o último dia de setembro, o mês que pintaram de amarelo para que houvesse um movimento de conscientização para a questão do suicídio. Assunto da maior gravidade, sua reflexão e abordagem cuidadosa não deve se restringir a um mês, mas deve ser exercitada todos os dias para que essa atitude que o argelino Albert Camus considerou como o único problema filosófico realmente sério seja evitada. Sério também, convém pontuar, não só do ponto de vista da filosofia, mas do ponto de vista jurídico, psiquiátrico, psicológico, antropológico, social.

Em uma atitude extrema, o homem deseja a libertação de seus problemas, medos e angústias. Um alto grau de sofrimento real ou causado por transtornos mentais, elege a morte voluntária como uma resposta efetiva. Sendo assim, enfrenta a sua finitude antes do previsto para sua existência. Muito mais do que coragem, esse ato exige uma consciência absurda de que tudo está perdido, que nada mais vale a pena, que não há mais saídas e tão pouco que a vida valha a pena ser vivida. Em geral, os casos de suicídio são marcados por um traço peculiar: a solidão. Pessoas que escolhem ceifar a própria vida são, amiúde, solitários e se despedem do mundo mergulhados na solidão. E ao contrário do que se pensa, o suicida dá sinais sim de que quer por fim à própria vida. É importante entendermos que, a probabilidade de uma pessoa cometer suicídio varia num contínuo, que contempla a ideação suicida – pensamentos acerca da possibilidade de cometer o suicídio -, a tentativa de suicídio – gestos autodestrutivos não fatais –, até ao suicídio consumado, que resulta em morte.

Quando nos defrontamos com o fato consumado é que vamos perceber as inúmeras mensagens e os infinitos pedidos de socorro quase sempre surdos aos nossos ouvidos, cristalizados e engessados pelo preconceito e pela eterna falta de tempo para ouvir e se sensibilizar com a dor alheia. Ninguém acorda um dia e resolve se matar. Apesar de quase sempre ser uma enorme surpresa para as pessoas que conviveram com o suicida, esse pensou, ponderou, planejou e adiou o quanto pode o ato extremo. Em geral é um processo, construído e se solidificado na angústia e no sofrimento. A pessoa se vê desamparada e desesperada, sem acolhimento a tal modo que a solidão toma um vulto perturbador e nada mais se clarifica para aquele em que sair da vida pode ser a alternativa derradeira  ou a tentativa eficaz para a paz que se mostra inalcançável.

Não feche seus olhos. Abra os ouvidos, preste atenção. A dor do outro, embora não seja sua, existe, é real. Precisamos considera-la e não banalizar. Toda vida é preciosa e devemos lutar para que a existência se cumpra de acordo com as leis da natureza e jamais seja ceifada contrariando o que nos foi dado como destino.

 

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Ângela Alhanati
contato@angelaalhanati.com.br
Livre pensadora exercendo seu direito à reflexão

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One thought on “O mês que pintaram de amarelo

  1. Meu filho suicidou-se aos vinte anos de idade.
    Foi um ato que me faz repensar todos os dias a minha capacidade de viver.
    O suicida se prenuncia sim, e precisamos ver desde a sua mais tênue infância.
    São tantas coisas que foram sendo empilhadas ao longo de sua existência e às quais eu não larguei tudo para atender que hoje só posso dizer que eu errei em não ter mandado muita gente para aquele olho cego, muita empregada que não mandei embora, muitas coisas que não fiz, namoros que devia ter terminado porque ele me pediu e minha solidão, se é que posso me dar essa desculpa me fizeram manter. Pessoas das quais hoje me afasto porque ele me pediu um dia. E coisas que vou fazer porque ele me pediu um dia também… Viver e ser feliz.
    E fazer outrem felizes sem me sufocar ou sufocar aos meus. De tanto dizer não aos meus filhos eu preciso dizer não para quem me fez dizer não para eles, principalmente eu mesma. Sair fora de mim e ficar comigo.

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