Poucos dias antes de viajar para o Líbano, no mês de maio, o prefeito de Resende, José Rechuan se reuniu em seu gabinete com integrantes do Ministério Público. Mais precisamente, no dia 14 de maio, uma reunião fora do horário reduzido do expediente. No final da manhã, no gabinete do prefeito com ordens para ninguém entrar, nem mesmo os secretários. Rechuan se reúne com integrantes do MP e tenta o que em Comunicação Empresarial chama-se abastecer o container do estoque de boa vontade. Mais abaixo entro em detalhes na “boa vontade”
O trâmite, ou melhor, o excelente trâmite conquistado pelo procurador do município, Kleber Luis de Souza tanto nos espaços do Ministério Público quanto no Fórum da Comarca de Resende dá certo conforto ao prefeito cassado que nem precisou sair de seu gabinete para reunir os promotores. Mas não é isso que interessa e sim o teor da conversa que até hoje nem prefeitura, nem Ministério Público trouxeram para conhecimento da população. Ao contrário do que preconiza a transparência pública, a agenda não foi divulgada e muito menos o assunto de relevância pública que usa o espaço público formalmente para uma reunião.
No mesmo dia, ao telefone falei com o responsável pela Assessoria de Comunicação da PMR, profissional que tenho muito respeito e carinho, Luis Claudio Hermógenes, que me disse que só ficou sabendo da reunião ao ver os promotores lá, à porta do gabinete, e não sabia o assunto. Pedi então, que verificasse e informasse ao BEIRA-RIO, pois a agenda do prefeito é pública. Passado algum tempo reforcei a solicitação e até o fechamento desta edição, não obtive resposta sobre o assunto. Já a Assessoria de do MP respondeu que: “ A Promotoria de Justiça de Tutela Coletiva e a Promotoria de Justiça da Família, Infância e Juventude de Resende não têm conhecimento de reunião que teria sido realizada entre o MP e o prefeito no último dia 14 de maio, na Prefeitura de Resende”. Bem, mas a informação que recebi do assessor da PMR me basta para tentar entender o que pretende o prefeito de Resende.
Claro que, até aqueles que questionaram o não acesso ao gabinete, defendem a “conversa privada” dentro do público. Uma cultura lamentável deste governo que ainda não aprendeu nada sobre a Lei 12.527/11. Além da não-revelação, até agora, do teor da conversa entre prefeito e promotores, não é difícil inferir que diante das ações de contenção de custos e a anunciada crise do município, Rechuan quis antecipar o que o povo vai amargar, ou melhor já começou a amargar.
Conhecendo a prática do prefeito cassado, que administra sob liminar, onde a participação popular e o respeito pela interação e transparência se resumem aos discursos falaciosos – são tantos os exemplos: concessão da destinação do lixo, casos de crimes ambientais, negligência ao saber do perigo das obras de creches, entre outros – não duvido, que, além de se colocar como vítima das circunstâncias, o prefeito tenha criado alguns monstros que surgiriam, após suas medidas, criticando-o, responsabilizando-o e claro, rotulando esses críticos de “inimigos” da municipalidade. Pois só os inimigos recorrem ao MP, procuram respostas pela Justiça. Isso, claro, no entendimento do prefeito Rechuan e sua claque.
Não duvido que tenha a estratégia de mostrar deferência ao Ministério Público que prima pelo interesse da sociedade, em suas explicações e vitimização, para, por exemplo, programar uma festa milionária de aniversário da cidade, mas ao mesmo tempo retirar os remédios das unidades de saúde, não pagar vale-alimentação de servidor, e apesar de ter como medida de corte de despesas reduzir o número de veículos na prefeitura, permite que vários cargos comissionados circulem nos finais de semana para fins particulares, usando veículo e combustível público, mas falta dinheiro para contratar profissionais na área da saúde para o programa de prevenção à dengue, mesmo tendo o município figurado, vergonhosamente, com a maior epidemia de todos os tempos e a maior do estado do Rio de Janeiro. Da mesma maneira não contrata monitores e libera crianças das creches às 11h, sem compromisso com o caráter constitucional do atendimento. Quer reduzir 15% dos investimentos da saúde, alegando que precisa economizar, mas não consegue enxugar a folha de pagamento que conta com mais de 1.300 cargos comissionados, boa parte usada apenas para blindar os desmandos e descasos públicos, além é claro, da reserva eleitoral.
O estoque de boa vontade, termo cunhado pelo competente jornalista Paulo Nassar, é uma boa estratégia, principalmente para empresas que, por exemplo, têm na essência do seu negócio algo prejudicial à vida da população e claro, precisa se mostrar à comunidade não como bicho-papão, mas como parceiro. No caso do prefeito Rechuan, essa tentativa junto ao MP e apenas, junto ao MP, demonstra seu total descaso à população que esta sim, aceitou o estoque de boa vontade há muito tempo, tanto que o reelegeu. Se o pessoal ligado à Justiça que lá esteve saiu com apertos de mãos, sorrisos e convencidos que Rechuan tem boas intenções, alguma coisa vai mal. Muito mal. Depois de sete anos de governo ninguém precisa de boa intenção. Tudo, menos boa intenção, vá! É como penso!
Não adianta justificar os cortes para cumprimento de legislação. Isto também não é novidade. É lei. Aliás, lei que não foi cumprida em diversos momentos, inclusive na apresentação das contas do município que deveria ter ampla publicidade para que a população pudesse participar, mas os avisos são sempre de um dia para o outro e a audiência se resume aos secretários do próprio governo. Queremos transparência e já!
Esse governo não me representa e claro, acredito continuar a contar com o MP para nos representar. As inferências são baseadas na conjuntura e fatos que se apresentam, o teor da conversa do dia 14 de maio cabem tanto ao MP quanto a prefeitura divulgarem em nome do interesse público, e a esperança, minha gente… essa, segue inabalável!
Ana Lúcia
editora do jornal BEIRA-RIO
analucia@jornalbeirario.com.br

