Não. Não é sugestão para a contravenção mais popular do Brasil, até porque o animal chifrudo ficou fora do grupo dos 25, muito menos, o título deste artigo, é um convite pra saborear uma buchada na Feira de São Cristovão, mas a expressão bem conhecida significa que a situação ficará infernal para alguém ou um grupo. Pois bem, penso que a expressão cabe perfeitamente no resultado da audiência realizada quarta-feira, dia 24, na 2ª Vara Cível de Resende sobre o Caso Chorume, como ficou mais conhecido o dano ambiental e desrespeito ao contrato de concessão da Águas das Agulhas Negras e, tudo sob o manto do poder do governo municipal, representado pelo prefeito cassado José Rechuan, como veremos mais abaixo. E por quê? Ora, porque depois de dois anos de processo, o juiz acatou uma alegação de alguns minutos da parte ré e admitiu ser incompetente para julgar o caso. Assim sendo, determinou que o processo seja remetido para a Justiça Federal.
Se a transferência para outra competência é bom ou ruim ainda não se sabe. O que tem que ficar claro é o que é bom e o que é ruim nessa história toda. Foi o jornal BEIRA-RIO que fez a denúncia do despejo do chorume industrial, vindo de Volta Redonda, numa estação de tratamento de esgoto (ETE) de Resende. A estação, patrimônio do município foi passada para a concessionária para execução dos serviços pertinentes ao contrato de concessão, mas muito diferente disso, usou o local, quebrando princípios contratuais para trazer lixo de outra cidade e ganhando por um tratamento completamente desconhecido das autoridades e muito menos da população. E pior, a ETE constava como fechada, sem uso para a Sanear, órgão que deveria fiscalizar a concessionária. Na ocasião, a Sanear informou que notificou para esclarecimentos a concessionária e que tomaria outras medidas. O flagrante feito pelo BEIRA-RIO mostrou uma carreta com placa de carga perigosa 90-302 depositando resíduos no local. Teve acesso a notas ficais que mostravam a origem do chorume (Prefeitura de Volta Redonda). Resumo: a merda de Volta Redonda foi jogada em Resende. Bem, se isso não for considerado ruim, aquela história de “escuta sempre a voz de tua consciência” é puro marketing do famoso God que, aliás, como arquiteto do mundo anda bem próximo de Resende nos últimos anos, talvez não à toa, esta área (arquitetura) tenha se destacado tanto no governo atual, inclusive com fluxos autotélicos no trânsito, desperdiçando assim as energias dos cidadãos e o pouco tempo que poderiam ganhar para atividades mais prazerosas. Ao contrário, acabam entre buzinas, gás carbônico e apitos de guardas.
Quero deixar claro que o God acima é aquele cantado pelo genial John Lennon: “God é um conceito pelo qual medimos nossa dor”. Pois é. O juiz ter se considerado incompetente para julgar, depois de dois anos de processo, um caso com tantas provas de dano a um contrato de concessão pública e dano ambiental para o município e para a população de Resende é de deixar qualquer um a dizer “ I don’t believe...”, mas ao contrário de Lennon acredito que the dream isn’t over porque sou da gangue de São Francisco que com o faminto reparte o pão; aos pobres e forasteiros dá hospitalidade, mas também sou como São Tomé e acredito nas palavras do Filho: “Eu sou o caminho, a verdade e a vida; ninguém vai ao Pai senão por mim.” O chorume? Aaa sim, o chorume. O chorume ganhou investigação até na Polícia Federal, o inquérito policial de nº 0028/2012-4 já que o lixo – quase 800 toneladas – foi despejado no Rio Paraíba do Sul, mas isso não tira, na minha opinião, o dano local e principalmente o desrespeito a um contrato, que pelo jeito nem foi levado em consideração nesse julgamento.
Vou reproduzir aqui, parte do que escrevi em 2012 sobre o assunto: O prefeito José Rechuan Junior admite que o prefeito de Volta Redonda fez um contato falando sobre o problema de destinação de chorume e que teria pedido sua ajuda. Rechuan disse que encaminhou o prefeito Neto para buscar uma solução possível, mas disse que o encaminhamento não significou autorização para o despejo e disse que não sabia da operação da AAN. A afirmação do prefeito já tira as dúvidas de quem arrisca uma defesa do indefensável dizendo que a denúncia não é confiável. É sim! A equipe do BEIRA-RIO depois de receber a denúncia foi ao local e também flagrou um caminhão fazendo o despejo.
Se todos estes motivos parecem pouco importantes para uma resposta, para um posicionamento à população, tem um que acho irrefutável: a quebra de confiança que um contrato de concessão por 30 anos tem que ter. Mais! Confiança pode parecer subjetivo, então vamos aos termos técnicos e jurídicos: a AAN incorreu em infração contratual de natureza grave (ou não?) porque desviou-se do objeto do contrato ao tratar substância tóxica sem ao menos comunicar o poder concedente. Ou essa terra (Resende) é de ninguém? Ou é de quem pode mandar?
Espero sinceramente que a resposta do governo municipal através da Sanear, Amar o ar que for seja realmente de uma apuração técnica sobre a toxicidade do produto e sobre o desrespeito da AAN com a população que paga por seus serviços. Torço sinceramente para que a resposta não seja uma distorção da denúncia com foco apenas na toxicidade (ou não) ou poluição (ou não) provocadas pelo chorume, porque isto é importante sem dúvida, mas não é só isso. O governo tem por obrigação “estimular o aumento da qualidade, produtividade, preservação do meio-ambiente e conservação”. A menos que eu seja a mais nova sem-noção da terra, despejo de chorume sem autorização e em local inapropriado, não me parece corresponder esse item do artigo 29, da Lei n° 8987 que versa sobre a concessão de serviços públicos.
As perguntas agora são: será que levará mais dois anos para uma decisão? A Justiça Federal poderá entender que também não lhe compete e devolver ao Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro? Por que uma cidade que se pretende moderna tem tantas dificuldades no respeito às questões ambientais? São muitas interrogações e o fato de que os réus fizeram bem a parte deles: conseguiram postergar o processo. No popular, empurrar com a barriga. Colou. Só não sabemos a qualidade da goma e quem vai ter que ficar com o bode. Porque de uma coisa eu tenho certeza: vai dar bode!
Ana Lúcia
editora do jornal BEIRA-RIO
analucia@jornalbeirario.com.br
Para entender o caso:
Autor do processo: Instituto Agulhas Negras (Inan)
Réus: Concessionária Águas das Agulhas Negras (CAAN), Município de Resende, Agência de Saneamento Básico do Município de Resende (Sanear), Agência do Meio Ambiente do Município de Resende (Amar), Prefeitura Municipal de Volta Redonda e Hidroserv Ltda.
Leia também: Página 2
http://issuu.com/leodapressa/docs/chorume_resende