QUEM PENSA? Por que esse angu tem caroço?

Na minhas visitas diárias e forçadas ao Hospital de Emergência nas últimas semanas impossível ficar distante do que nos cerca, da mesma maneira difícil não perceber a falta de manutenção em diversos setores do hospital que dificultam o trabalho do servidor. Desde a entrada, antes do feriadão, no pronto socorro levando minha mãe para atendimento que em todos os setores que passamos ouvi servidores combinando a hora de “compra a comida”. E sempre a referência à comida do refeitório do hospital é acompanhada de expressões faciais que denotam não apenas a falta de qualidade do que é servido, mas a falta de respeito aos usuários (pacientes e acompanhantes) e aos servidores que estão permanentemente necessitando deste serviço que o governo municipal vai chamar de “continuado” devido a sua importância. Mas como assim é importante e os que deveriam ser os maiores beneficiados não usufruem ou pouco usufruem deste serviço?

Como conselheira de saúde não posso ficar alheia ao que ouço e percebo nas unidades de saúde e por parte dos profissionais que lá trabalham. E se existem coisas muito positivas, como foi a mudança de rotina do CTI do Hospital de Emergência que a Secretaria de Saúde adotou, ouvindo os médicos daquele setor, que agora se revezam entre plantão e também rotina dando muito mais fluidez aos tratamentos e com isso diminuindo o tempo de internação da maioria dos pacientes, existem outras questões obscuras e às vezes, que parecem intocáveis, como é o caso destas refeições de baixas qualidade servidas no hospital.

Comecei a conversar com vários servidores e não encontrei um que elogiasse a comida, muitos lembram que em período de renovação de contrato, a comida melhora, mas depois que o contrato é renovado tudo volta como antes: “chegou depois das 7h não tem café e vai explicar que o ônibus atrasou. Pra quem?” “Já viu pão murcho pela manhã? É o que tem aqui”. “Informam um cardápio e servem outro”. “Precisa ver a comida como é. Às vezes vem aquela carne meio queimada sabe?” “Prefiro comprar comida. Porque a daqui é ruim mesmo”. “Chega no final do horário pra vê se você encontra comida, no máximo arroz seco no final. Se tem um horário, tinha que ter toda a comida até o final”. O pão às vezes vem até com cheiro de velho. Horrível. É só olhar nosso lixo. Tem gente que leva pro cachorro”. “Melhoram quando tem visita especial. Avisa que vem comer, pra ver só, se a comida não melhora”. “Sempre foi isso”. Essas são algumas das observações feitas pelos servidores, fora aqueles que preferem o silêncio das palavras, mas se expressam com trejeito faciais ou apenas com frases curtas: “iiii nem falo nada”, “a comida? Nossa. Nem falo nada”.

Penso que além do descaso a esta reclamação dos servidores porque muitos já se manifestaram sobre o assunto e há dois anos, quando lá no hospital, também acompanhando minha mãe, cheguei a comer no refeitório e pude constatar que a reclamação é pertinente, tanto que escrevi uma carta e enviei a direção daquela época. E agora, mais uma vez, o problema, mas que resolvi apurar com mais detalhes, até porque não posso integrar o Conselho Municipal de Saúde apenas como figura decorativa, represento o Comitê pela Transparência e Controle Social de Resende e sei da nossa responsabilidade. Por isso pedi todo o processo administrativo do contrato com a Nutri Hospitalar Alimentação e Serviços Ltda e mesmo sem abrir todo o processo me espantei com o contrato que tem seis aditamentos, sendo quatro aditamentos de prorrogação de prazo, ou seja, o governo municipal não promoveu novas licitações desde a que ocorreu em 2010. E antes disso, o governo Rechuan que usou como discurso durante a campanha de 2008 manteve por dois anos
a mesma empresa sob que condições contratuais? O processo é de 2009, quando ele entrou no governo, mas a incompetência (?) é tanta que só no final de 2010 houve a licitação e com vigência de novo contrato a partir de fevereiro de 2011. Dois anos para realizar uma licitação de uma área que em campanha teria muita atenção do governo.

E aí vem a pergunta inevitável, se a qualidade e prestação de serviço sempre deixou a desejar e se há dois anos eu mesma, como usuária, escrevi uma carta à direção relatando os problemas, porquê eles persistem? Por que não promoveram a partir de 2012 ou 2013 outra licitação? E agora em 2014? Já pediram nova prorrogação de prazo que vai até 30 de julho de 2014. Tudo, segundo a Procuradoria do município dentro da lei. Vejamos então: os documentos citam o artigo 26 da lei nº 8.666/93 que é a Lei de Licitações e Contratos da Administração Pública e diz a lei: O processo de dispensa, de inexigibilidade ou de retardamento, previsto neste artigo, será instruído, no que couber, com os seguintes elementos:

I – caracterização da situação emergencial ou calamitosa que justifique a dispensa, quando for o caso;

II – razão da escolha do fornecedor ou executante;

III – justificativa do preço.

IV – documento de aprovação dos projetos de pesquisa aos quais os bens serão alocados

Em quais dessa situação, por quatro anos, o governo Rechuan justificou a dispensa de uma nova licitação? Por quatro anos? Uma prorrogação caberia nos incisos II, III e IV, porque o I está descartado, já que sabemos que felizmente não passamos por qualquer situação emergencial. Qual a razão de um governo prorrogar por tantos anos um serviço, cuja qualidade é criticada o tempo todo pelas pessoas que deveriam ser beneficiadas? Por que não conseguiram fazer a empresa prestar um serviço de qualidade? São cerca de R$ 150 mil mensais pagos à empresa que nesse meio do caminho conseguiu reajustar o serviço que deveria ser prestado com muita qualidade aos cerca de 500 servidores, lembrando que semanalmente é uma média de 120 servidores fazendo as refeições e não 500, já que a grande maioria trabalha no regime de escala de 12 por 36 ou 24 por 48 e ainda tem aqueles que trabalham apenas 24h por semana; aos pacientes dos 53 leitos (se tiverem todos ocupados, levando em consideração que boa parte está no soro e não se alimenta) e os que comem é aquela tradicional sopa de hospital, às vezes uma porção de alimento, e gelatina e os poucos acompanhantes que também tem número flutuante.

Estou lendo com muito cuidado todo o processo administrativo deste contrato e levarei o resultado aos meus colegas do Conselho Municipal de Saúde para que possam junto comigo chegarmos a um conclusão sobre este serviço deficiente (mais um) que o governo municipal de Resende não consegue prestar – já que não fiscaliza a empresa e exige qualidade – aos munícipes e servidores. Volto ao assunto. Da mesma maneira, o assunto da acusação de furto de medicamentos do Hospital de Emergência que até hoje a Secretaria de Saúde não deu explicações à sociedade como se o assunto fosse irrelevante. Um desrespeito total. Houve uma primeira preocupação em afirmar que “não houve desvio” ignorando completamente as palavras e a investigação do delegado de Barra Mansa que comandou a operação em Resende que apreendeu drogas em São Caetanos, um acusado de tráfico no bairro Paraíso e por fim, a ligação com servidores (cinco ou seis como ele mesmo citou) do Hospital de Emergência indiciados sob a suspeita de desvio de medicamentos como morfina e adrenalina que eram misturadas às drogas. Não entendi, até semana passada, porque o secretário de Saúde, Daniel Brito insistia em afirmar que não havia desvio ao invés de uma resposta clássica, mas de prestação de contas, como por exemplo: “vamos apurar se realmente isso aconteceu”. Mas é que se revelou nesse assunto, que é a mulher do secretário é a responsável técnica da Farmácia do Hospital e a reação foi de defesa e não explicação. Lamentável! Seguimos acompanhando os fatos.

Ana Lúcia
editora do jornal BEIRA-RIO
analucia@jornalbeirario.com.br

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