Rechuan e o salto alto

A eleição municipal em Resende já é passado e a aprovação de 50% (um pouquinho mais, é verdade) dos eleitores de Resende legitimam o trabalho de José Rechuan Junior (PP) por mais quatro anos. Passada a “batalha” é hora de desarticular  os ataques aos flancos adversários, baixar as bandeiras e olhar no entorno, porque a “guerra” apenas começou. Tudo bem que não é essa a palavra usada na campanha, mas governabilidade é o que o prefeito deve perseguir a partir de agora e não mais os fantasmas de guerra.

A violência aumenta na cidade; as prestadoras de serviço começam a cobrar – e com isso a faltar -,  cedo demais, sua “colaboração” no período eleitoral: os sinais já estão nítidos na cobrança retroativa da tarifa de esgoto e na falta de regularidade no recolhimento do lixo na cidade; entidades sociais fecham as portas; e o pior de tudo, há uma lista enorme de credores políticos ávidos por terem seus empréstimos ou préstimos devidamente quitados.

Rechuan tem muitos desafios pela frente, mas ele sabe disso, afinal, a vitória eleitoral é um prenúncio da consolidação de tudo que foi dito, prometido e averbado. Ou não? Mas quase um mês depois da eleição, é o salto alto, que no seu sapatear, ecoa e revela ações governamentais apressadas, “daquele jeito que ele é, rapidinho mesmo”, sabe?

Do contrário, porquê o prefeito de Resende que deve pautar-se não por uma satisfação de vitória particular, mas pelo bem comum e preservando o debate das questões públicas resolve fazer um decreto silencioso regulamentando a lei de acesso às informações públicas exatamente num momento em que cidadãos e entidades organizadas discutem este tema? Quando o vereador Gláucio Julianelli (PSB) estuda na Câmara, a pedido do Comitê pela Transparência, uma minuta de regulamentação através de lei e não decreto como fez apressadamente Rechuan?  

Talvez falte a Rechuan – dentro de sua própria linha – a leitura dos pensamentos kantistas sobre exercício da cidadania e assim preservar e incentivar este exercício que agora, não se refere apenas aos mais de 46 mil eleitores, mas aos 120 mil cidadãos que moram em Resende. Do contrário, o espírito revanchista tirará na devida proporção o que lhe conferiu: o poder legitimado. É assim que a roda gira.

O assunto pode não empolgar a maioria da população – ainda – mas com certeza à medida que os resultados aparecerem e já estão aparecendo Brasil afora, mais cedo ou mais tarde essa atitude apressada, para não dizer autoritária, exporá as reais intenções deste documento e, consequentemente, do próprio governo que aposta na leniência da população e num resultado que já ficou pra trás.

Sinceramente, gostaria muito de parabenizar o governo pela publicação do decreto, apesar de entender que a regulamentação deve ser feita por lei, se este atendesse de fato os requisitos da transparência e da possibilidade do exercício do controle social. O governo de Resende se apressa em outras questões: publica uma tabela confusa de remuneração para dizer que está cumprindo a lei, mas o que quer é evitar a divulgação nominal dos servidores e cargos comissionados, suas respectivas funções e faixas salariais. Ninguém quer uma investigação da intimidade do servidor, apenas aquilo que a própria Constituição já confere e é ratificada pela Lei 12.527. Afinal, quando função e salário de servidor e CCs deixaram de ser assunto público?

Apesar do quadro que se desenha e o embate que a sociedade organizada, e que tem trabalhado pela divulgação dos dados públicos, parece terá pela frente, sou otimista. Eu digo não ao fatalismo que se abate sobre alguns grupos e pessoas nesse período pós-eleição na cidade de Resende e digo mais: há ao contrário do que imaginam, depois de muitos anos, a possibilidade de surgimento de novas lideranças que primem por uma política menos competitiva e mais ética. Eu creio. E de certa forma, é a era Rechuan que abre esta possibilidade. Esse é o processo de crescimento do Estado democrático e amadurecimento político.

Mas voltemos a pressa de Rechuan, em especial a um artigo que me chamou a atenção do decreto nº 6173, publicado no dia 19 de outubro: “Art. 29. O acesso permanece restrito às informações que tratam do sigilo fiscal, bancário, patrimonial, médico, profissional, comercial, de correspondência e das comunicações telegráficas e de dados e das comunicações telefônicas, conforme legislação de regência.” Hum? Uma invenção do governo municipal de Resende que só serve para consolidar a falta de transparência e não o contrário a que se pretende o decreto. E outra para rir: telegráficas? De que mentalidade jurássica saiu isso? Lembrança dos porões, será?

Há também no decreto de Rechuan uma preocupação em manter a relação dos servidores e CCs numa caixa preta. O decreto ainda mostra a não disposição do governo em criar uma estrutura e uma cultura de acesso à informação quando vincula o Serviço de Informação ao Cidadão, instituído pela Lei Federal, à Ouvidoria do município. Longe de ser mãe Dinah, mas esta iniciativa, com algumas particularidades, já foram cantadas aqui mesmo, nesta coluna, em outros artigos sobre o mesmo tema. E bingo! Esta aí, ironicamente, a falta de transparência do governo Rechuan ao regulamentar a Lei de Acesso às Informações Públicas, a começar por apresentar o decreto publicado. Bem diferente do que foi dito pelo próprio prefeito na abertura da etapa municipal da Consocial em fevereiro deste ano. Na ocasião, eu estava ao lado de Rechuan, quando ele falou da “construção com a sociedade”.

Meu conceito de construção é muito diferente desta atitude do prefeito José Rechuan, e claro, de sua equipe, que ainda tenta blindar o governo. Mas de quê mesmo? E insiste no salto alto, uma das características desse governo além da razoabilidade das vaidades e dose tolerável de orgulho político-partidário (na verdade, nem sei se existe isso).. Gostaria de estar acometida de uma cegueira, um minimalismo, cuja redundância apenas me inspirassem a escrever, mas temo não ser assim.

Ana Lúcia
editora do jornal BEIRA-RIO
analucia@jornalbeirario.com.br

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