Quem é o nosso inimigo

O povo elegeu um ditador. Mas ditadores são eleitos? Quando somos incapazes de reconhecer nossos inimigos passamos a matar uns aos outros. Matamos os idosos que não recebem aposentadoria integral; matamos os jovens que jamais irão se aposentar; matamos os moleques da favela para o policial ficar em segurança; matamos os professores, pois quem sabe um dia não nasceremos sabendo!; matamos os livros! Vamos aprender a desmontar um fuzil e isso será suficiente; matamos todas as idéias contrárias; matamos o estado laico; matamos a história, a filosofia e até a matemática, da qual sobraria apenas a tabuada decorada; matamos os artistas porque inventam; matamos quem não quiser conservar o mundo tal como era no período medieval; matamos quem quiser criar direitos para as minorias; matamos quem não beijar o anel de ouro do papa; matamos quem não quiser apreciar o desfile militar; matamos os inteligentes; matamos os oponentes dos EUA; matamos a reforma agrária, mas damos sopa porque somos caridosos; matamos os ateus e os maconheiros; matamos as prostitutas, porque não são mulheres do lar; matamos o trabalhador (de tanto trabalhar); matamos os homossexuais; matamos os comunistas (e outros também, pois não sabemos quem eles são, então matamos muitos, para aumentar a chance de acertar); matamos os loucos; matamos os negros; matamos qualquer suspeito de ser dono de qualquer coisa, se tiver nascido pobre. Matamos quem não pertença, desde o berço, ao Klan.

Matamos a educação pública de qualidade. Por isso somos incapazes de distinguir a mão que nos afaga da mão que nos espanca. E é assim que um povo elege um ditador.

Rafael Alvarenga
Escritor e professor de Filosofia
ninhodeletras.blogspot.com.br

Foto: Pixabay

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