Especialistas são contrários a intervenção federal no Rio de Janeiro

A assinatura do decreto que autoriza a intervenção federal no estado do Rio de Janeiro pelo presidente Michel Temer (MDB), na tarde desta sexta-feira, dia 16, está sendo questionada por especialistas e entidades. Segundo uma reportagem realizada pelo jornal O Globo, a discordância está “baseada na avaliação de que nem todas as alternativas foram esgotadas”. A publicação ainda coloca que “consultores da área concordam, entretanto, que a medida é drástica e nunca foi tomada desde a promulgação da atual Constituição em 1988”.

O coronel Robson Rodrigues da Silva, da reserva da Polícia Militar do Rio, é um dos contrários à medida. Para ele, “a medida excepcional prevê um esgotamento de todas os recursos disponíveis pelos entes federativos para a solução de problemas na área, o que Rodrigues acredita não ter ocorrido”. Ele cita como exemplo a ausência de um Plano Nacional de Segurança Pública efetivo, o que está na retórica das autoridades.

– Sou totalmente contrário. Você não esgotou todos os recursos. É uma medida excepcionalíssima. Qual foi o esgotamento? Você não esgotou todos os recursos dos entes federativos e já lança mão de uma medida excepcionalíssima? Quando você pede a intervenção é porque se rendeu. Mas por quê? Incompetência? Má gestão? Falta de capacidade gerencial? Qual o maior esforço desprendido pelas forças policiais hoje? Normalmente é o crime do tráfico de drogas. Legalmente, é uma atribuição do governo federal. Poderia ter, por exemplo, uma força tarefa da PF para o Rio”, afirma o coronel, que também atuou como coordenador Geral das Unidades de Polícia Pacificadora (UPP).

Rodrigues questiona o quadro da violência no estado, uma vez que em sua opinião, outros Estados passam por situações tão ruins quantos a do Rio no combate à criminalidade. E nem a eleição (em outubro, haverá eleições estaduais e federal) foi deixada de lado da análise desta decisão em um primeiro momento.

– Tem Estados com situação tão ruim quanto o Rio. Isso passará a ser norma? Temos que avaliar outros objetivos ou outras razões porque estamos em um ano eleitoral. Ainda estamos num estado democrático de Direito, então precisam passar informação a população, a principal interessada. Já vimos que o Exército em outras ações não resolveu muita coisa. Não precisaria de uma intervenção para o governo federal agir. É estranho que o próprio governador peça, porque o normal seria o governador se colocar numa posição refratária. Isso decreta a falência da sua gestão – completa o coronel.

A Comissão de Justiça do Trabalho da Ordem dos Advogados do Brasil do estado do RJ (CJT/OAB-RJ) também se opõe à medida adotada por Temer. O órgão, através de seu presidente, Marcus Vinícius Cordeiro, também se manifestou “com acentuada preocupação” em relação à intervenção.

– Conceder às Forças Armadas brasileiras a plena gestão da segurança pública do estado, ainda que os alarmantes índices de violência exijam medidas sérias de proteção e resguardo dos cidadãos, não parece indicar o caminho mais seguro para solucionar os sérios problemas socioeconômicos que, gerando o abismo de desigualdades, propiciam o descontrole social vivenciado no país – justifica o presidente.

Cordeiro defende que outras providências consideradas eficazes, mas adiadas, na saúde, educação, saneamento básico, empregabilidade e outras áreas seriam a melhor opção para toda a população do que a medida assinada pelo Presidente da República e que a intervenção seria uma ameaça ao Estado Democrático de Direito.

– Providências eficazes, mas eterna desonestamente adiadas, nas áreas de educação, saúde, saneamento básico, empregabilidade e outras mais que denotam a plena cidadania para todos, e não apenas a uma parcela da população, seriam bem mais producentes nessa busca do equilíbrio do que as baionetas que estão por vir. (…) Por outro lado, a entrega de tão amplos poderes aos militares, hoje pelo fundamento da violência, como no passado o foi para combater a corrupção e a alegada esquerdização do país, faz tabula rasa do sistema político como meio democrático de organização da sociedade e facilitador de soluções, fortalecendo os piores segmentos da sociedade que nunca conviveram harmoniosamente com o Estado Democrático de Direito, vendo nele, inclusive, barreira para realização de seus desígnios autoritários e acumulativos de privilégios – acrescenta.

SECRETÁRIO DE SEGURANÇA DEIXA O CARGO
A intervenção federal no RJ foi assinada por Michel Temer, que por sua vez diz ser uma “medida extrema”, mas necessária para combater o crime organizado. A assinatura aconteceu nas presenças do governador do estado, Luiz Fernando Pezão (MDB), ministros e do presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM). “Tomo essa medida extrema por que as circunstâncias assim exigem. O governo dará respostas duras, firmes e adotará todas as providências necessárias para enfrentar e derrotar o crime organizado e as quadrilhas. Não podemos aceitar passivamente a morte de inocentes. É intolerável que estejamos enterrando pais e mães de família”, disse o presidente em pronunciamento à imprensa.

Já o governador Pezão informou que o Rio de Janeiro tem pressa e urgência em resolver a questão da violência e que as polícias Militar e Civil do estado não estão conseguindo deter a guerra entre facções criminosas. “Precisamos de uma força maior para momentos extremos e estamos vivenciando esse momento. Precisamos muito dessa intervenção”, disse o governador.

Com a intervenção federal, foi nomeado como interventor o general Walter Souza Braga Netto, atual chefe do Comando Militar do Leste, responsável por coordenar, controlar e executar as atividades administrativas e logísticas do Exército Brasileiro nos estados do Rio de Janeiro, Minas Gerais e Espírito Santo. Mineiro de Belo Horizonte, o militar já chefiou a 1ª Região Militar, que abrange Rio de Janeiro e Espírito Santo. Em 2016, atuou como coordenador-geral da assessoria especial para os jogos olímpicos e paralímpicos do Rio de Janeiro. Em setembro do mesmo ano, assumiu o controle do Comando Militar do Leste, no Rio de Janeiro.

A intervenção estará em vigor, segundo o Artigo 1º do decreto, até o dia 31 de dezembro de 2018. A medida fez com que o secretário estadual de segurança pública do Rio de Janeiro, Roberto Sá, colocasse o cargo à disposição na manhã desta sexta-feira. Após ser assinado, o decreto será votado pelo Congresso Nacional na próxima semana. O vai direto ao plenário da Câmara na segunda-feira à noite ou na terça-feira de manhã, para que então siga para o Senado.

Foto: Beto Barata/Presidência da República

Fontes: Agência Brasil e Valor Econômico

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