Foi em uma noite de inverno sem internet que ela resolveu olhar pela janela aberta. Não passava ninguém pela rua calma. E como não havia uma brisa sequer também as folhas da mangueira não incitavam a imaginação. O mundo sem internet fica assim, sem graça, pensou a moça antes de desmoronar o queixo na mão.
Esteve assim aquela moça até que virou a cabeça, apoiou a bochecha na mão e viu o cachorro que dormia enrolado em si mesmo próximo ao muro lateral. Na casa do vizinho as crianças não choravam. E hoje, logo hoje nessa noite de inverno sem internet, não havia mosquito que incomodasse. A moça pensou que podia ler um livro. Um romance moderno é claro, não os clássicos brasileiros que a professora a obrigava na escola. Entretanto, como ler se o celular estava sem internet? Um verdadeiro tédio aquela noite naquele mundo sem internet; foi o que a moça pensou em escrever no face se tivesse internet.
Sei que para cada pensamento a moça criava uma careta de descontentamento. Logo teve a ideia de fotografar suas expressões bizarras. Fez uma série. Daria uma exposição “tédio contemporâneo”. Porém a moça se distraiu e riu da vida como ria sempre. Isso até o instante que pensou em mandar algumas das fotos, pelo whatsapp, para amigas e namorado.
O mundo sem internet fica assim, sem graça, pensou a moça antes de desmoronar novamente o queixo na mão.
Na sala, sentada no sofá vendo a novela das 8, a mãe dizia para o pai que cochilava: E essa menina que não sai dessa tal de internet?
Rafael Alvarenga
Escritor e professor de Filosofia
ninhodeletras.blogspot.com.br