Vereadores de Resende dão mais uma carta branca para o prefeito Rechuan

dividasOs vereadores da Câmara Municipal de Resende votaram e aprovaram em primeira e segunda votação, na noite desta quinta-feira, dia 11, em Urgência Especial, o Projeto de Lei 002/16, de autoria do prefeito José Rechuan Junior (PP), que “autoriza o Poder Executivo a celebrar termo aditivo ao contrato nº 104, formado com a União”. Na mensagem que acompanha o projeto, o prefeito explica que o decreto federal 8.616/2015 permite que os municípios quitem suas dívidas com a União, adotando novos critérios de refinanciamento da dívida, mas que ele exige a autorização dos vereadores para que a operação seja realizada. No entanto, quatro dias antes de o projeto ser encaminhado à Câmera, o Supremo Tribunal Federal (STF) havia concedido uma liminar que libera os municípios da autorização dos vereadores para fazer o refinanciamento da dívida, tornando sem sentido o PL 002/16 e, principalmente, sua urgência. Na prática, o que o projeto realmente faz é dar mais poderes para o prefeito alterar o Orçamento, através do artigo 5º.

O projeto foi enviado ao plenário da Câmara no dia 4,  com pedido de votação em Urgência Especial. Desta forma, o projeto poderia ser votado e aprovado no mesmo dia, sem ter que passar pelos trâmites normais de análise de projetos da Casa legislativa, que duram 45 dias. No entanto, os vereadores votaram contra a Urgência Especial após a leitura do projeto, explicando que eles não “haviam tido tempo hábil de avaliar a proposta”. No dia seguinte, dia 5, o secretário municipal de Finanças, Renato Viegas, se reuniu com os vereadores para explicar o projeto e eles então optaram por marcar uma sessão extraordinária para votá-lo, no dia 11, ainda sob a justificativa de urgência.

Segundo a proposta apresentada, o projeto autoriza o Poder Executivo a celebrar um termo aditivo ao contrato nº 104, para o pagamento da dívida do município com o Banco do Brasil, podendo o banco inclusive debitar e transferir os valores devidos de uma conta fornecida pela Prefeitura de Resende caso esta não tenha realizado os depósitos devidos.

O primeiro refinanciamento de empréstimo junto a União, no valor de R$ 21.084.016,56, foi conseguido em maio de 2000 pelo município de Resende. Embora já tenham sido pagos R$ 61.518.471,45 entre 2000 e 2014, o saldo devedor do município ainda era de R$ 49.249.052,58 quando 2015 começou, de acordo com informações do Sistema de Informações do Banco do Brasil (foto). Enquanto não estiver pagando as dívidas em dia, o município perde o direito de se incluir em programas de financiamento do Governo Federal e esta foi a alegação da Prefeitura de Resende para que os vereadores aprovassem a proposta.

No entanto, desde o final de janeiro, a aprovação da adesão ao decreto 8.616/2015 não é mais necessária. Isso porque o decreto foi publicado no dia 29 de dezembro de 2015 e exigia que os municípios aderissem até o dia 31 de janeiro de 2016. No entanto, a Frente Nacional de Prefeitos (FNP) e as direções do PT e PPS argumentaram que, como a maioria das câmaras municipais entra de recesso no período, nenhuma cidade conseguiria aderir ao decreto. Por isso, a vice-presidente do STF, ministra Carmem Lúcia, concedeu no dia 29 de janeiro uma liminar permitindo que os estados e municípios aderissem ao decreto sem pedir autorização às câmaras municipais. A liminar seria válida até a publicação de outro decreto pelo Governo Federal, em que este proporia os mesmos índices de refinanciamento, mas sem a exigência de autorização dos vereadores. O decreto foi publicado no dia 10 de fevereiro, confirmando que não havia necessidade do legislativo autorizar a adesão dos municípios.

“Parece-me indiscutível a excepcionalidade da exigência de pronta atuação judicial neste caso e neste período de recesso, quer pela gravidade das consequências que poderiam advir da prática de atos fundados em normas cuja constitucionalidade estão sendo questionadas, quer pela proximidade do término do prazo legal para repactuação” explicou a ministra Carmem Lúcia, quando expediu a liminar.

Além de o projeto municipal ter sido enviado dias após a concessão de liminar e votado após o novo decreto, o que o tornaria desnecessário, chama a atenção o artigo 5º, através do qual, “Fica o Chefe do Poder Executivo autorizado a promover as modificações orçamentárias que se fizerem necessárias ao cumprimento do disposto nesta Lei”. Ou seja, de acordo com este artigo, o Orçamento do Exercício de 2016 fica aberto a qualquer alteração do Executivo sem a necessidade de consulta ao Legislativo, desde que o prefeito justifique que a mesma foi feita para pagar a dívida renegociada com a União.

Também chamou a atenção a pressa do Executivo em votar um projeto que reduziria as dívidas do município e, na mesma quinzena, enviar para uma sessão extraordinária do Conselho Municipal de Cultura (Comcultura) para votar a isenção fiscal de projetos particulares que, em um ano, pode fazer com que o município deixe de arrecadar R$ 1 milhão, segundo informações dos próprios conselheiros. “Se o município está endividado e refinanciando como renuncia Receita desta maneira?” indagou o advogado Marcelo Tavares num comentário sobre o assunto que chegou nas redes sociais.

No dia da votação, o secretário municipal de Finanças, Renato Viegas, não deu explicações plausíveis para que o projeto fosse levado adiante, mesmo após a publicação do decreto.

— Já que os vereadores participaram da assunção desta dívida, nada mais justo que participem do desconto, que será de mais ou menos R$ 38 milhões de abatimento. A dívida passa para zero, não devemos mais nada – declarou Viegas, contrariando as explicações das diversas prestações de contas, quando o controlador do município sempre declara que esta dívida é “impagável para os municípios”.

Se em 2014 o município devia mais de R$ 49 milhões, pagou cerca de  R$ 6 milhões e teve juros acrescidos, como a dívida de 2015 pôde ser de apenas R$ 38 milhões? Outro questionamento foi o fato de nem a Procuradoria da Câmara ter tido acesso ao projeto antes das votações do dia 11. Atualmente, estima-se que a dívida atual – incluindo o ano de 2015 – com o Banco do Brasil seja superior a R$ 52 milhões.

— Não quero me manifestar sobre o projeto porque ele nem passou pela minha análise – disse o procurador-geral da Câmara, João Paulo Perez dos Anjos.

A presidente da Câmara em exercício, vereadora Soraia Balieiro (PSB), esclareceu que somente o prefeito poderia retirar o projeto, mas que os vereadores o votariam mesmo com a liminar porque ela não era definitiva, demonstrando ignorar a informação que recebeu que o decreto federal foi publicado no dia anterior desobrigando o legislativo de tal apreciação e votação.

— Não posso retirar o projeto, quem retira é o Executivo, mas isso também não muda nada, não dá prejuízo para a Câmara e para ninguém, só reforça. O Governo Federal estava para fazer o decreto, mas não tinha feito, todo mundo só ficou sabendo agora do decreto. Mas a liminar não era algo definitivo, era precária, como explicou nossa assessoria jurídica – declarou a vereadora que presidiu a sessão que aprovou um projeto cuja ementa faz referência a algo cujo objeto não existe.

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