QUEM PENSA?

Seu bem mais precioso

A difícil missão de criar filhos num mundo tão competitivo, lúdico e veloz tem me dado a oportunidade de refletir profundamente sobre várias questões. Uma delas é sobre o discurso ultrapassado que ainda usamos (nós pais) para tentar fazer o filho crer que o que falamos é para o seu próprio bem. Isso só funciona quando damos o exemplo. Você não pode ficar muito tempo no computador, costumamos falar aos filhos, mas nem sempre nossa permanência na frente da tela é restrita ao trabalho. Você precisa ler mais e desligar a televisão, mas raramente os pais que fazem essa recomendação dedicam-se a contar histórias para seus filhos pequenos antes de dormir. Coma mais frutas e legumes, mas seu filho costuma observar seus lanches noturnos com queijos, salgadinhos e bebida alcoólica. Mantenha-se distante da droga é uma recomendação típica, mas alguns pais de adolescentes, por exemplo, já não conseguem lembrar a última vez que tiveram uma atividade-adrenalina com os filhos.
Temos muitas coisas a dizer e quase nunca estamos dispostos a ouvir ou mesmo observar. Observar o filho, seu corpo, suas atitudes seus olhos. Um pai e uma mãe devem conhecer os filhos além das aparências, pelo menos acredita-se nisso. Mas hoje, está difícil a própria observação. A observação de si mesmo, assim como a do papel desempenhado. Ainda que os entendimentos psicológicos modernos desobriguem os pais das culpas das frustrações dos filhos, penso que uma reflexão sobre a participação ou não, nos resultados da vida de um filho, mereçam atenção maior do que temos dado nesses tempos modernos.
Dia desses assistindo um vídeo postado no Facebook, sob o título, “o inacreditável poder da concentração” pude perceber o quanto deixamos passar momentos importantes. Momentos frágeis, mas indeléveis e que de alguma maneira terão um peso mais adiante em nossas vidas. Papo de auto-ajuda esse meu hoje, neste artigo, mas tem uma razão. Entrei numa fase de rever valores. Fase séria e perigosa, mas como passei bem por uma outra mais difícil, a existencial, penso que essa vou tirar de letra. Espero. O fato é que revendo valores me percebi dentro de uma modernidade cujo resultado sempre considerei prejudicial às relações, mas até então às relações sociais, já que tiramos de nossos costumes, as visitas aos amigos e familiares dias de domingo, por exemplo. Agora, só vamos se convidados. Aquelas visitas inesperadas que faziam a chaleira chiar para um café fresco ou mesmo um bolinho de chuva improvisado para servir às visitas já era. O maior prejuízo que entendo hoje, está mesmo na falta de atenção que os familiares mais próximos merecem receber uns dos outros. Sempre cultivei alguns hábitos de reunião familiar; fui criada assim e considero importante, mas aos poucos sem que a gente note vai sendo engolido pelo trabalho, pelo imediatismo, pela massificação, pelo fast food, pela tecnologia, pela virtualidade das relações. Cansei. Volto a incluir em minhas leituras Charles Dickens e Alexandre Dumans. Sem preconceitos ou medo da água com açúcar. Pois, o que me interessa está na forma da narrativa, cujo tempo é o seu mais precioso patrimônio e com ele, de volta, o olhar self, assim como o olhar para os mais próximos. Semana de paz com pitangas, acerolas, amoras e flores na janela.
Ana Lúcia
Editora do jornal BEIRA-RIO
analucia@jornalbeirario.com.br

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