Morador denuncia falta de cloração da água após surto de gastroenterite em Itatiaia

Morador mostra coletor onde pode-se ver que a água fornecida pelo município não apresenta cor amarelada em contato com reagente, ao contrário da água de sua piscina, que costuma ter cloro em sua composição (Foto: Reprodução/Redes Sociais)

Essencial para a vida de todos os seres vivos, a água necessita de cuidados e de tratamento ao ser captada na natureza. Sendo assim, os municípios contam com órgãos responsáveis por esse trabalho, seja eles um serviço autônomo de água e esgoto (que funciona em Barra Mansa e Volta Redonda) ou uma concessionária (que é o caso de Resende).

Em outros lugares como Itatiaia, o serviço é prestado por um órgão mantido pela prefeitura. No entanto, a gestão no tratamento da água fornecida aos moradores do município foi questionada após o aumento no número de casos de gastroenterite, uma vez que o serviço de pronto atendimento do Hospital Municipal teve o seu atendimento dobrado na última sexta-feira, dia 23, ocasionando naquele momento a falta de medicamentos e outros insumos (em média, o atendimento é de 80 pacientes por dia).

Ainda que a prefeitura não tenha descoberto a verdadeira origem do surto, uma vez que é comum que a virose também se espalhe pelo ar, a Secretaria de Saúde, em nota divulgada pelo governo local, tem disponibilizado aos moradores nas unidades básicas de saúde como forma de prevenção frascos de Hipoclorito de Sódio para a higienização da água usada para consumo e lavagem de frutas e verduras.

Morador de Itatiaia desde o ano de 1986, quando veio trabalhar como operador na Usina do Funil, Rodrigo Paes gravou um vídeo postado em seu grupo nas redes sociais no último sábado, dia 24, onde questiona e mostra que o tratamento de cloração da água não está sendo feito na estação de tratamento local, fazendo teste com um coletor de água.

– A água de Itatiaia não tem tratamento adequado. E ainda que não bastasse isso, não está tendo cloração (colocação de cloro na água, uma das etapas do tratamento). E eu afirmo isso. Eu vou fazer aqui um teste bem idiota: eu tenho uma piscina em casa e a gente usa um produto pra medir a quantidade de cloro na água da piscina, pra que ela tenha condição de uso. E eu peguei a água da torneira, a água que vem da rua antes de passar na caixa d’água, e coletei. Coloquei o produto reagente nessas duas coletas de água, nessas duas amostras. Esse é o resultado, na casa de ninguém tem a mínima quantidade de cloro! – aponta Rodrigo, alegando que o problema pode estar por trás dos casos de gastroenterite registrados nos últimos dias.

No mesmo vídeo, Rodrigo também critica a falta de atenção das autoridades locais em relação ao abastecimento da água, e em entrevista ao jornal BEIRA-RIO, relembra como era gerido o abastecimento de água no município. “Bem no início, o trabalho era feito por um órgão estadual, depois passou para a Cedae (privatizada ano passado pelo Governo Estadual). Com a emancipação (de Itatiaia), o governo que assumia a gestão do município, em 1989, tornou-se responsável por administrar esse sistema de tratamento e distribuição, que consiste apenas em adicionar cloro e nada mais”.

Ele cita que a distribuição da água é captada de rio que vem do Parque Nacional do Itatiaia (PNI), na altura da Usina Velha, e no final da estrada do Benfica uma canaleta conduz para uma tubulação, onde recebe o cloro, que segundo o operador não é adicionado há oito meses. Depois, a água é direcionada para a cidade. “Esse sistema é muito antigo e sofreu pouca alteração ou modernização ao longo do tempo – uns 65 anos ou mais”, acrescenta.

Outro problema verificado na cidade é o constante vazamento de água, observado no trecho da estrada do Benfica, e que atrapalha o abastecimento nos bairros. Rodrigo conta que no passado houve uma tentativa mal sucedida de fazer a troca das tubulações. “Houve uma troca, no inicio dos anos 90 um material que foi feito para substituir as tubulações de ferro fundido. Esse produto novo não foi aprovado. Deteriora muito rápido com o contato com a terra”.

“COISAS DA VIDA”
Mesmo não sendo um especialista no assunto, Rodrigo entende a necessidade das estações de tratamento da água. “Meu pai foi responsável pelo tratamento de água da cidade de Três Rios (SAAETRI). Era um tempo, onde havia uma certa complacência e muitas vezes ia para o serviço do meu pai. Desde moleque estava numa Estação de Tratamento de Água. Por convivência assisti muita coisa, jamais imaginei que seria um conhecimento a ser utilizado. Coisas da vida…”.

Com o aprendizado do dia a dia, Rodrigo tem percebido que durante os 32 anos de emancipada, a cidade teve poucas mudanças no sistema de abastecimento e queda na qualidade dos serviços, contrastando com o que é oferecido pela natureza.

– A água que vem da natureza em Itatiaia é de qualidade e está numa escala de contaminação muito baixa. Tem a proteção de uma área que está inserida zona de Área de Proteção Permanente (APP), Área de Proteção Ambiental (APA), e monitoramento por órgãos ambientais como Ibama, ICMBio, bem como Órgãos Estaduais. Um ponto muito bom é que a turbidez é baixa e a alcalinidade também, sendo necessário pouca adição de produto químico, o que nos colocaria em um nível de qualidade muito bom. A grande diferença é a irresponsabilidade de quem administra não estar fazendo cumprir o mínimo do básico: adicionar o cloro.

Com o conhecimento adquirido ao longo dos anos, o morador conta com uma cisterna de uns 20 mil litros e um outro reservatório de 2,5 mil litros em casa, onde frequentemente costuma fazer adição do cloro, através de pastilhas, para tratar a água e evitar que a família tenha problemas com a gastroenterite. “Felizmente não tive problemas com a gastroenterite, mas desta vez minha filha foi acometida, como varias crianças da escola (onde ela estuda). Na sala dela tenho certeza de seis alunos com o mesmo problema”, completou.

Prefeitura confirmou falta de material para estação de tratamento realizar cloração da água (Foto: Reprodução/Redes Sociais)

FORNECIMENTO DE CLORO INTERROMPIDO
O jornal BEIRA-RIO também ouviu a Prefeitura de Itatiaia em relação aos questionamentos sobre a falta de cloro no tratamento da água. A nota esclarece que “hoje o tratamento da água em Itatiaia é de responsabilidade da Secretaria de Meio Ambiente, e esse processo é feito com aplicação de cloro nos reservatórios de água”.

A prefeitura, no entanto, confirmou que em janeiro deste ano o fornecimento de cloro foi interrompido por falta de renovação de contrato. “A nova gestão, que assumiu a prefeitura em abril deste ano, vem tomando todas as providências necessárias para regularizar essas questões. A previsão é que o processo de licitação e compra do cloro seja concluído nos próximos dias”, justifica.

Sobre o leilão da Cedae realizado após a privatização da empresa, também questionado, a prefeitura informou que mesmo sendo contemplado com a possibilidade de inclusão em um dos lotes de concessão, declinou da participação por decisão de governos interinos. A atual gestão optou por dar continuidade a elaboração de um plano de saneamento junto com a Associação Pró-Gestão das Águas da Bacia Hidrográfica do Rio Paraíba do Sul (Agevap). Também estão sendo feitas reuniões para discutir o avanço das questões sanitárias e fitossanitárias no município.

Já em relação ao surto de virose, segundo a Secretaria de Saúde, a nota lembra que a Vigilância em Saúde enviou as amostras das fezes dos pacientes com gastroenterite para o Laboratório Central Noel Nutels (Lacen), no Rio de Janeiro, e aguarda os resultados para diagnosticar a causa.

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