Romeiros: entre a fé e o perigo na principal estrada da região

Acidentes envolvendo romeiros é a principal preocupação da PRF nesta época do ano

O Dia de Nossa Senhora Aparecida, Padroeira do Brasil, celebrado nesta terça-feira, dia 12, costuma ser marcado pela peregrinação dos romeiros ao Santuário Nacional de Aparecida, no Vale do Paraíba Paulista. Essa demonstração de amor e fé, no entanto, acaba tendo um alto preço para muitos romeiros que resolvem realizar a pé ou de bicicleta o trajeto até o santuário.

Tudo isso devido ao fato deles serem obrigados a dividir o espaço com outros veículos como carros, ônibus e caminhões, às margens da Rodovia Presidente Dutra, principal via de acesso a Aparecida. Mesmo com o trabalho conjunto de orientação entre a Polícia Rodoviária Federal (PRF) e a concessionária que administra a rodovia, que visa reduzir o número de acidentes, e com todos os perigos que a estrada oferece, essas pessoas acabam arriscando a própria vida e entram para a estatística de peregrinos mortos todos os anos.

Isso aconteceu no ano de 2017 com um romeiro de Resende, o ex-presidente da Associação de Moradores do bairro Jardim do Sol, Gladstone Andrade de Almeida, que foi atingido por um caminhão quando estava quase chegando a Aparecida. Na época, ele não resistiu aos ferimentos.

Este ano, os atropelamentos voltaram a ser registrados na Dutra, com quatro vítimas fatais, entre os dias 9 (sábado) e 10 (domingo) em municípios vizinhos a Aparecida. O primeiro atropelamento foi em São José dos Campos, onde três romeiros foram atropelados e um deles, que era um policial militar, de 47 anos, acabou não sobrevivendo. O segundo, em Pindamonhangaba, foi de um ciclista atingido por uma mulher que perdeu o controle do veículo. Ele chegou a ser atendido em um hospital, mas também não resistiu aos ferimentos.

Os outros dois romeiros mortos foram uma mulher de 42 anos, que realizava a romaria ao lado de uma prima de 35 anos, que ficou gravemente ferida, ambas atropeladas por um motorista que fugiu sem prestar socorro, e também um homem de 40 anos, que foi esmagado por um caminhão enquanto dormia. Ambos os acidentes ocorreram em Caçapava.

Ainda que seja arriscado caminhar pela Via Dutra como forma de cumprir uma promessa a Nossa Senhora Aparecida, o que será que leva muita gente a cometer esse tipo de erro em nome da fé? Para ter essas respostas, o jornal BEIRA-RIO entrevistou o sociólogo Gilberto Caldas para entender o que infelizmente acontece para alguns desses devotos da padroeira. O sociólogo lamenta o ocorrido com as quatro vítimas. “Em princípio, devemos lamentar as mortes acontecidas durante a romaria na Rodovia Presidente Dutra. É lamentável, vamos nos solidarizar com as famílias pelas perdas acontecidas”, diz.

Ainda assim, ele acrescenta ser interessante a necessidade do ser humano em ter a sua fé. “A gente precisa acreditar em alguma coisa, e temos que considerar a realidade de que Nossa Senhora Aparecida é a padroeira do Brasil. E não só os católicos, mas também outras crenças religiosas a aceitam como padroeira”.

Aparição de Nossa Senhora aconteceu em outubro de 1717, quando imagem foi encontrada no Paraíba do Sul

Gilberto aproveita para relembrar a origem da história da padroeira, que conduz os fiéis para a Basílica todo dia 12 de outubro. “A romaria vem de uma origem muito interessante. Pescadores necessitando ter o seu pescado pra sobrevivência lançaram as redes ao rio, e de lá, ao invés de peixe, eles subtraíram uma pequena imagem. E a partir dali eles tiveram as redes repletas de peixes. Conta-se também que a princesa tinha dificuldade de ter filho. Então ela foi até Aparecida, pediu uma intercessão da Santa e depois ela teve três filhos. Então o que que acontece? Ficou estabelecido que aconteceu milagres. E esses milagres eram relatados essas eu pedir e conseguir e aí estabeleceu-se a fé da romaria”, descreve.

Ele também cita que por esse motivo muitos vão a Aparecida para agradecer as graças recebidas e outros tantos para pedir graças. “Quando você tem fé, você não tem dificuldade, você vai a pé, quer dizer, aquela aquela ideia do sacrifício? Eu preciso fazer um sacrifício pra ter méritos, assim como subir a escada da Penha (igreja famosa no Rio de Janeiro por seus 382 degraus) de joelhos e ou ir até Aparecida a pé, mesmo sabendo que existem riscos por causa da rodovia de intenso tráfego, e principalmente com chuva, é muito complicado”.

O sociólogo enfatiza qual tem sido a principal dificuldade dos romeiros em evitar situações perigosas durante a sua peregrinação.

– Mesmo com intensas campanhas de orientação, de instrução, de educação pra que as pessoas tenham muito cuidado durante a a sua caminhada, durante a sua romaria, quando você tá imbuído de um determinado objetivo, principalmente quando se trata da área da fé, essas coisas tomam até uma dimensão mínima. E isso embota um pouco a nossa capacidade de percepção do perigo, pois achamos que não vai acontecer nada, a gente pensa sempre assim, principalmente por estar fazendo um ato de grande potencial religioso, de aproximação com o sagrado. Mesmo com todas as campanhas da Polícia Rodoviária Federal, o impulso da fé é mais forte.

Gilberto finaliza a entrevista destacando a necessidade de romeiros e motoristas estarem alertas com a segurança nesta época do ano.

– É preciso que as pessoas tenham um senso crítico de separação no momento da fé e no momento da realidade que tem que enfrentar pra chegar ao objetivo que se propõe, que é chegar até Aparecida com a máxima segurança, com mínimo de risco e com e com a possibilidade de um planejamento pra que a coisa não aconteça de forma diferenciada. E os motoristas precisam entender isso também, principalmente se considerando a dificuldade da rodovia, onde os carros avançam sempre em velocidades superior e os acidentes nas rodovias são muito graves porque a velocidade registrada é muito grande, sempre acima de 100 Km/h. Aí, diante de um de um imprevisto qualquer, um romeiro, uma escorregada, uma freada, ou uma fechada, o carro vai acabar saindo da estrada e pegando as pessoas que estejam andando pela rodovia – conclui.

ORIENTAÇÕES AOS ROMEIROS
Durante os dias de peregrinação de romeiros, a concessionária que administra a Rodovia Presidente Dutra e a Polícia Rodoviária Federal (PRF) trabalharam com ações de segurança de trânsito e reforço nas orientações aos grupos de romeiros sobre os riscos de caminhar a pé pelo acostamento em direção ao Santuário Nacional de Aparecida. A concessionária realizou ações de orientação em sua rádio oficial, sintonizável em 107,5 FM ou nos aplicativos de rádio no celular, informando sobre pontos com presença de peregrinos no acostamento e grupos de ciclistas na rodovia, além de reforçar as dicas de segurança da Polícia Rodoviária Federal.

Já a PRF orientou grupos de romeiros com diversas dicas de segurança e orientação, entre elas a preferência para caminhar pela contramão do fluxo de veículos, em fila indiana e em grupos pequenos; Usar roupas claras; Nunca caminhar durante a noite ou se fizer, utilizar colete refletivo ou roupas claras; Evitar caminhar na chuva; e principalmente redobrar a atenção nas entradas e saídas da rodovia, nos acessos aos postos de combustíveis, vias locais, faixas de aceleração e desaceleração. E no caso de motoristas em veículos de apoio, estes devem estacionar longe da rodovia.

Fotos: Arquivo, Guia Aparecida e Silas Basílio/TV Vanguarda

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