Sem nenhuma explicação a moradores, PMR notifica e causa insegurança no Boa Vista I e II

Cláudia, moradora do Boa Vista II: “Ninguém nos procurou para dizer que seria feita uma limpeza no córrego, não ficamos sabendo nada disso”

Imagine a cena: um cidadão compra um lote de terra, com tudo regularizado pela Prefeitura de Resende, constrói sua casa, e mais de 20 anos depois é notificado a sair de seu terreno porque foi desviado o curso de um riacho para dentro de seu bairro, e a Prefeitura se utiliza desse argumento para a realização de uma obra no local. Esse tem sido o drama de moradores de duas ruas, Mario Jardim Freire e José Cataldo, uma no Boa Vista I e outra no Boa Vista II, respectivamente, em Resende, que no final de julho foram notificados a deixarem suas casas.

– Foi colocado em nossa caixa de correspondência uma notificação da prefeitura que eu só descobri no dia 30 (de julho) porque meu vizinho foi lá me perguntar se eu tinha recebido. O que é uma falta de respeito para com munícipes que somos pagadores dos nossos impostos! – contou Claudia Adriana, representante do bairro Boa Vista I, durante audiência pública convocada pelo vereador Renan Marassi (PL), e realizada na quinta-feira, dia 11, para tratar sobre o problema da notificação da Prefeitura que tanto atormenta o sossego dos moradores.

Ela especificou que o motivo alegado seria o fato de sua casa estar localizada dentro de uma área hídrica, e que todos os moradores dali teriam que sair daquela área em oito dias. “Aí eu pergunto: o que é a área hídrica que eles estão julgando? Por que eles querem que a gente saia? Só que ficamos sem resposta. E ninguém nos procurou para dizer que seria feita uma limpeza no córrego, nem manilhamento, não ficamos sabendo nada disso. Agora a gente está sem dormir, com medo de que nossas casas sejam demolidas, e alguns vizinhos nos procuraram chorando, também com medo”.

Ebenezer, morador do Boa Vista I: “É uma arbitrariedade nunca vista antes”

A moradora ainda citou que a poucos dias da audiência, a Prefeitura teria se retificado, e cancelado o documento emitido e enviado aos moradores em julho. “Porém, esse documento que eles entregaram também não tem data, e mandaram pros moradores assinarem. Alguns assinaram, mas lá em casa não passaram ainda. Eu quero saber ainda o que vai acontecer? O que a prefeitura municipal tem para os bairros Boa Vista I e II? Outra coisa, se eles tem um projeto, eles tem um Plano Diretor. Onde está esse Plano Diretor que nós queremos ver!”, acrescentou.

O encontro convocado por Marassi, além do autor da audiência e dos vereadores, também contou com a presença de procuradores, outros moradores de ambos os bairros e também dos representantes da construtora Merisa. No entanto, mesmo sendo alvo de críticas, o prefeito Diogo Balieiro não compareceu, muito menos enviou um representante responsável na Prefeitura.

Outro morador do bairro vizinho relatou que o próprio prefeito, em suas falas, vem alegando que os moradores colocaram suas casas na área onde fica uma passagem hídrica natural, mas isso não condiz a verdade, pois se trata de uma passagem hídrica artificial, feita pelo homem.

– O Código Florestal de 2012 determina que não se pode construir próximo a passagens naturais, o que não é o nosso caso. E por causa dessa afirmação do prefeito, foi colocado que nós estaríamos irregulares. Isso é impossível, pois a prefeitura nos deu a documentação, inclusive a do habite-se, se houvesse algo ali não haveria aprovação nem do projeto da Merisa (empresa que vendeu os terrenos). Isso é que não pode acontecer, vamos impedir isso a todo custo. É uma arbitrariedade nunca vista antes, está nos apavorando! – desabafou Ebenezer Gomes Cardoso, representante do Boa Vista II.

Prefeitura não manda representantes pra audiência, mas justifica lei e obras para desalojar moradores de lotes próximos a córrego artificial

Após receberam a notificação, os proprietários dos imóveis localizados nos bairros procuraram o vereador Renan Marassi. Segundo o parlamentar, moradores, de ambos os bairros receberam a notificação da Prefeitura, dando conta “de que, dentro de um prazo curto de tempo, serão feitas intervenções ou desocupação de moradias’’, para o avanço de obras de infraestrutura previstas para aquela região, pelo Executivo. Ainda de acordo com os moradores, entre os investimentos previstos estão ampliação e pavimentação de vias, além da limpeza de córregos.

– Tomei conhecimento (da notificação) logo após a entrega da correspondência de desocupação nas residências, fui procurado por moradores e imediatamente marcamos uma reunião na Câmara Municipal! Nesta reunião decidimos marcar a Audiência pública em caráter de urgência e também fui a prefeitura buscar informações – citou Marassi.

Segundo ele, a prefeitura de fato entregou uma nova notificação no dia da audiência pública, revogando a antiga, e os moradores avisaram que o funcionário da prefeitura comunicou que a audiência estaria cancelada, mas o parlamentar desmentiu a informação. Questionado sobre a ausência de representantes do Executivo, o vereador respondeu que pretende fazer uma nova convocação.

– Combinamos na audiência de convidar os secretários responsáveis na câmara municipal para prestar esclarecimentos. Caso eles não apareçam novamente, iremos fazer a convocação em caráter de urgência e também faremos um requerimento de informação com todos os itens que foram tratados em audiência.

CURSO DE RIACHO FOI DESVIADO EM 2004
O alvo de discussões entre Prefeitura e moradores gira em torno de um curso d’água descoberto somente 10 anos depois da venda dos terrenos, conforme explicou o procurador da Câmara de Resende, Lucas Prates, que analisou o caso. Segundo o procurador, o loteamento dos bairros, comercializado pela Merisa, foi aprovado pela própria Prefeitura de Resende no ano de 1993, no Boa Vista I, e posteriormente no Boa Vista II, no ano de 1995.

Com os lotes devidamente comercializados e as obras realizadas, e regularizados os terrenos, de acordo com Lucas, o que foi relatado em uma reunião com os moradores é que foi observado posteriormente a existência de um trecho hídrico que teria sido desviado para aquela região, e que até então não existia, por volta do ano de 2004. E a partir dessa modificação, que não existia na época da construção, passou a haver um possível impedimento da legislação ambiental nesse sentido.

E com a nova obra de pavimentação da Prefeitura, em frente aos dois bairros, observou-se que alguns imóveis dali poderiam causar “um impedimento na limpeza desse riacho, e que implicaria em dano para a obra, com inundações e coisas desse tipo”.

– A maquina não conseguiria entrar no riacho com esses imóveis, e por esse motivo foram notificados 68 lotes, incluindo os Lotes de 1 ao 34, da Quadra A do Boa Vista I; Lotes 1 a 9 da Quadra 17 do Boa Vista II; Lotes 1 a 13 da Quadra 18 do Boa Vista I ,e os lotes de 1 a 12 da Quadra 19 do Boa Vista II. Nessa notificação da Prefeitura (aqui no link com a retificação posterior), que foi revogada posteriormente e que causou alvoroço entre os moradores pedia para que qualquer construção sobre o corpo hídrico fosse demolido, não mostra expressamente o que estava escrito, deixando todos preocupados – completou o procurador.

PEDIDO DE REQUERIMENTO
Outros vereadores também se pronunciaram durante a audiência. Foi o caso do vereador Tiago Forastieri (Progressistas), que também lamentou a ausência do prefeito Balieiro e de sua equipe, e anunciou que encaminhará um pedido de requerimento para apurar o principal motivo que fez a prefeitura notificar os moradores, e também informações sobre a obra.

– Eu queria propor aqui para o nosso jurídico fazer um requerimento de informação dessa Casa sobre o caso. Em relação ao projeto original de aprovação, se houve algum estudo de impacto ambiental que comprove esse esse desvio que foi feito esse córrego, e se ali era previsto este córrego e se ele existia então, pra que a prefeitura seja obrigada a enviar essas informações para nós, pois se no projeto original não há nada de água, anula-se tudo o que foi feito em diante, não tem nem que se discutir isso aqui!- concluiu.

O QUE O PREFEITO DISSE?
Durante o evento, um dos moradores mostrou um áudio da entrevista concedida há poucos dias pelo prefeito a uma rádio FM, ele justificou a notificação dos moradores ao ser perguntado por um ouvinte.

– Essa pergunta primeiro a gente tem que falar genericamente. Não é permitido construir próximo de nenhum curso d’água. Seja um riacho, seja um córrego, seja um rio como Sesmaria, seja um rio como o Paraíba. Cada curso d’água tem função, a gente não pode construir ao lado dele, desrespeitando a distância. E a gente está fazendo uma obra importante ali entre o Boa Vista I e o Boa Vista II, inclusive com desapropriação de alguns imóveis, e a gente precisa fazer melhorias no canal que tem ali. Infelizmente, os muros das casas estão construídos de maneira irregular dentro do canal e precisam ser removidos – citou Balieiro.

Fotos: Divulgação e Reprodução/TV Câmara

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