Marcha da Maconha de VR sofre com resistência de autoridades e moção de repúdio

Marcha da Maconha, realizada em várias cidades brasileiras, acontecerá pela primeira vez na região (Foto: Reprodução/Mídia Ninja)

A Marcha da Maconha, movimento que defende mudanças nas leis relacionadas a maconha, em favor da legalização da cannabis, regulamentação de comércio e uso (tanto recreativo quanto medicinal e industrial), tradicionalmente realizada em maio há mais de 20 anos no Brasil, acontecerá pela primeira vez em um município da região (Volta Redonda) no dia 29, a partir das 14h20, na praça Juarez Antunes (ao lado do Escritório Central) e seguirá pela rua 33 até o destino final, na Praça Pandiá Calógeras (ETPC).

Desde que foi confirmado para esta data, o evento vem sofrendo forte resistência por parte da sociedade, em especial de políticos. E nesta terça-feira, dia 17, o movimento sofreu com mais uma ação de resistência por parte desses grupos. É que a Comissão de Segurança Pública e Combate ao Crime Organizado, da Câmara Federal, aprovou uma Moção de Repúdio de autoria do deputado federal Delegado Antonio Furtado (União Brasil/RJ), contra o movimento.

O parlamentar, que já atuou na polícia e foi eleito com votos de Volta Redonda e região, assim como a maioria dos 25 integrantes da comissão, votaram a favor da moção e contrários ao evento, com exceção de Paulo Teixeira (PT), de São Paulo. Sua justificativa é que “a marcha é uma manifestação legítima e que deve ser realizada, inclusive em outras cidades, já que foi permitida pelo Supremo em 2011”.

O autor defende a moção (que ainda será encaminhada pra apreciação em plenário), e diz que o momento é de resistir e somar esforços para que o evento não seja realizado, evitando impactos sociais e familiares muito ruins.

– As famílias de Volta Redonda não querem essa marcha que aumentará ainda mais os jovens envolvidos com drogas. Ou seja, ela não gera nada de positivo. Caso não seja impedida, essa iniciativa pode desencadear um cenário de desordem e de apologia às práticas criminosas. O objetivo deles é afundar nossa juventude no mundo devastador do vício, onde muitos não estudam ou trabalham, acabando no crime. Mas estamos lutando e fazendo todo o possível para impedir que isso aconteça. Não cederemos a ameaças e nem a intimidações. A nossa luta é maior e em prol da segurança e da proteção da sociedade – frisou.

O deputado, no entanto, esclareceu que é favorável à utilização do CBD (Canabidiol), uma das substâncias presentes na maconha, para fins medicinais, sendo que o componente não causa dependência e alucinações. Ele ainda acrescentou que o uso terapêutico, para tratar ataques epilépticos e tremores, o qual defende, deve ser discutido, reforçando que esse emprego não traz nenhum perigo, pois se dá sob orientação médica, e difere totalmente da utilização recreativa, abusiva e indiscriminada da droga.

– Precisamos conscientizar a população quanto aos riscos do uso da maconha. Engane-se quem pensa que estamos falando apenas de sensações momentâneas e brandas. A vida das pessoas pode ser afetada para sempre, sem possibilidade de reversão. Entre os efeitos da maconha, podemos citar o comprometimento da capacidade cerebral, perda da memória, alteração da coordenação motora, ataques psicóticos, aumento do risco de problemas cardíacos, paranoia, delírios de perseguição e agressividade, entre tantos outros. Sem falar que as consequências são bidirecionais, trazendo resultados negativos para quem usa a droga e para outros ao seu redor, especialmente a família do dependente – concluiu Furtado.

Segundo matéria do portal Cannalize, o evento não sofre resistência apenas do parlamentar autor da moção de repúdio, que segundo a reportagem, acredita que a marcha é o que ele chamou de “desserviço prestado à população”, e ainda acrescentou que fará todo o possível para impedir que o evento aconteça. E que teria solicitado ao delegado titular da 93ª DP, Luiz Jorge Rodrigues, o planejamento de ações para repressão dos participantes.

Quem também se manifestou contrário ao evento foi o presidente da Câmara Municipal de Volta Redonda (CMVR) e pré-candidato a deputado federal, vereador Sidney Teixeira, o Dinho (Patriota), que afirmou estar “unindo todos os esforços políticos do Legislativo municipal e das forças de segurança pública” para inviabilizar um evento.

O parlamentar vem, desde o início do mês de maio, adotando medidas oficiais para que o evento não tenha permissão dos órgãos públicos para acontecer.

ORGANIZADORES PUBLICAM CARTA ABERTA
Com a pressão sofrida por parte das autoridades, os organizadores da primeira Marcha da Maconha de Volta Redonda escreveram e publicaram uma carta aberta sobre o assunto. No documento, a organização relembra o reconhecimento da manifestação pelo Supremo Tribunal Federal (STF) em 15 de junho de 2011, estando garantida em duas liberdades individuais revestidas de caráter fundamental: o direito à reunião e o direito à livre expressão.

A carta defende que “ao contrário do que foi dito por estas pessoas, a Marcha da Maconha não se trata de apologia ao uso de drogas, tampouco se trata de uma convenção para a realização do uso das mesmas”. “A Marcha da Maconha se trata de uma manifestação pacífica que busca uma política de drogas mais democrática e pelo fim da chamada ‘guerra às drogas’, que na verdade é uma ‘guerra aos pobres’”.

Os organizadores encerram a carta citando que a marcha “luta contra o racismo estrutural, contra as chacinas que acontecem constantemente nas favelas, contra o encarceramento em massa, contra a homofobia, contra o obscurantismo, contra o fascismo, contra o negacionismo e contra toda a forma de preconceito”.

MARCHA LIBERADA PELO STF
Em decisão unânime (8 votos na ocasião), o Supremo Tribunal Federal (STF) liberou no ano de 2011 a realização dos eventos chamados marcha da maconha, que reúnem manifestantes favoráveis à descriminalização da droga. Para os ministros, os direitos constitucionais de reunião e de livre expressão do pensamento garantem a realização dessas marchas. Muitos ressaltaram que a liberdade de expressão e de manifestação somente pode ser proibida quando for dirigida a incitar ou provocar ações ilegais e iminentes.

Pela decisão, tomada no julgamento de ação (ADPF 187) ajuizada pela Procuradoria-Geral da República (PGR), o artigo 287 do Código Penal deve ser interpretado conforme a Constituição de forma a não impedir manifestações públicas em defesa da legalização de drogas. O dispositivo tipifica como crime fazer apologia de “fato criminoso” ou de “autor do crime”.

O voto do decano da Corte à época, ministro Celso de Mello, foi seguido integralmente pelos colegas. Segundo ele, a marcha da maconha é um movimento social espontâneo que reivindica, por meio da livre manifestação do pensamento, a possibilidade da discussão democrática do modelo proibicionista (do consumo de drogas) e dos efeitos que (esse modelo) produziu em termos de incremento da violência.

Além disso, considerou que o evento possui caráter nitidamente cultural, já que nele são realizadas atividades musicais, teatrais e performáticas, e cria espaço para o debate do tema por meio de palestras, seminários e exibições de documentários relacionados às políticas públicas ligadas às drogas, sejam elas lícitas ou ilícitas.

Celso de Mello ainda explicou que a mera proposta de descriminalização de determinado ilícito penal não se confunde com o ato de incitação à prática do delito nem com o de apologia de fato criminoso. “O debate sobre abolição penal de determinadas condutas puníveis pode ser realizado de forma racional, com respeito entre interlocutores, ainda que a ideia, para a maioria, possa ser eventualmente considerada estranha, extravagante, inaceitável ou perigosa”, ponderou.

Confira a carta da organização da Marcha da Maconha na íntegra:

Povo da cidade de Volta Redonda, a primeira edição da Marcha da Maconha realizada no Brasil ocorreu na cidade do Rio de Janeiro, no ano de 2002 (há 20 anos atrás) e em 15 de junho de 2011, por decisão unânime (ADPF 187 DF) o Supremo Tribunal Federal reconheceu a manifestação (Marcha da Maconha) como legítima, estando garantida em duas liberdades individuais revestidas de caráter fundamental: o direito à reunião e o direito à livre expressão.

Nos últimos dias, algumas figuras públicas da nossa cidade, através das redes sociais, jornais impressos e regionais, manifestaram-se contrário ao acontecimento da Marcha da Maconha VR e disseram que “vão fazer de tudo” para que a Marcha não ocorra, além de terem aproveitado a oportunidade para estarem disseminando desinformação e inverdades.

Ao contrário do que foi dito por estas pessoas, a Marcha da Maconha não se trata de apologia ao uso de drogas, tampouco se trata de uma convenção para a realização do uso das mesmas. A Marcha da Maconha se trata de uma manifestação pacífica que busca uma política de drogas mais democrática e pelo fim da chamada “guerra ás drogas”, que na verdade é uma “guerra aos pobres”.

A Marcha da Maconha luta contra o racismo estrutural, contra as chacinas que acontecem constantemente nas favelas, contra o encarceramento em massa, contra a homofobia, contra o obscurantismo, contra o fascismo, contra o negacionismo e contra toda a forma de preconceito.

Não é só para fumar que nós marchamos! Lutar pela legalização da Cannabis Sativa L., ou Maconha, ou Cânhamo, ou Diamba, oi Liamba ou Pito do Pango, ou qualquer nome que queira usar, é lutar pelo respeito, é lutar a favor da vida, a favor da ciência, da liberdade, da igualdade, da saúde, da dignidade humana de muitas famílias que necessitam da Maconha como ferramenta terapêutica para o tratamento das mais diversas patologias e transtornos, dentre elas Alzheimer, Parkinson, Diabetes, Dor Crônica, Câncer, Transtorno de Espectro Autista, Epilepsia, Endometriose, Esclerose Múltipla, Depressão, Ansiedade, Transtorno do uso do Álcool e muitas outras.

Dito isso, gostaríamos de convidar a população de Volta Redonda para estar comparecendo a Marcha da Maconha VR , que acontecerá no dia 29 de maio de 2022, à partir das 14h20 na praça Juarez Antunes (ao lado do Escritório Central) e seguirá pela rua 33 até o destino final, na Praça Pandiá Calógeras (ETPC).

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