Vacinação contra a Covid-19, tarefa difícil para quilombolas

Morador da Comunidade Quilombola de Santana, em Quatis, durante aplicação da segunda dose (Foto: Divulgação/PMQ)

Um levantamento inédito, divulgado no último dia 6, mostra que a vida do povo quilombola em tempos de vacinação contra a Covid-19 não é tarefa das mais fáceis. O documento, com o nome de “Vacinômetro Quilombola – Retratos da situação da vacinação da Covid-19 nos quilombos”, que fez uma pesquisa com 445 quilombos em todo o país mostra que 43% dos territórios mapeados apresentam algum problema na vacinação. São 193 quilombos que relataram dificuldades, que resulta em uma média de 15.407 quilombolas sem conseguirem se vacinar. O estudo é realizado pela Coordenação Nacional de Articulação de Quilombos (Conaq), com apoio da Terra de Direitos e da Ecam Projetos Sociais.

Segundo o levantamento, entre os principais problemas mapeados, estão a dificuldade de vacinação de quilombolas não residentes no território por motivo de trabalho ou atuação política em outras localidades, impedimento de vacinação de maridos, esposas e enteados não quilombolas residentes no território, e dificuldade no planejamento e execução da vacinação. Denúncias relativas ao direcionamento de doses a pessoas não quilombolas e de tentativas de pessoas não quilombolas se vacinarem nos quilombos também constam no levantamento.

– Esse levantamento dá um panorama de como as políticas públicas não chegam às comunidades quilombolas. Mesmo com uma decisão judicial, muitos quilombos ainda enfrentam dificuldades de vacinação, seja pela não titulação de territórios ou pela falta de planejamento e execução das campanhas de vacinação. Também existem conflitos nos municípios e o não aceite de um grupo da sociedade de quilombolas como grupo prioritário – analisa Kátia Penha, da Conaq.

Dos 445 quilombos consultados, 346 ainda não são titulados e 33 não foram certificados pela Fundação Cultural Palmares (vale ressaltar que a demarcação de territórios quilombolas no Governo Bolsonaro atingiu o menor patamar da história).

Em decisão proferida em junho deste ano, o Ministro do STF, Edson Fachin, determinou que a União considere quilombolas não residentes no território no plano de vacinação. Entretanto, a decisão contempla apenas quilombolas que não residam no território por motivos acadêmicos ou de saúde. A delimitação de não residentes apenas nessas categorias é a razão, segundo análise dos dados, de problemas identificados em 54 quilombos, conforme destaca a assessora jurídica da Terra de Direitos e da Conaq, Vercilene Dias.

– Existe um rol maior de quilombolas que não residem em seus territórios. São comunidades expulsas de seus territórios, quilombolas que buscam oportunidades de trabalho e outros que estão em mobilização política. O território é aparato central da luta quilombola, mas não pode ser utilizado para negar direitos. Excluir todo um grupo de quilombolas é contraditório à própria decisão do Ministro e enfraquece a identidade quilombola – defende a assessora jurídica.

Na região do Médio Paraíba, dois municípios abrigam terras de comunidades quilombolas. Em Quatis, onde fica a comunidade de Santana, foram vacinadas 277 pessoas, sendo 143 com a primeira dose e mais 134 já com as duas doses. A imunização ocorreu entre março e maio. Já na comunidade de São José da Serra, em Valença, foram vacinadas 49 pessoas, sendo que apenas duas receberam as duas doses.

Confira abaixo alguns dados do levantamento

Amostra de quilombos consultados:
– 445 quilombos mapeados
– 23 estados
– 246 municípios
– 138.230 quilombolas identificados
– 90.075 quilombolas vacinados só com a primeira dose
– 32.748 quilombolas vacinados com a segunda dose
– 15.407 quilombolas não foram vacinados

Situação dos quilombos consultados:
– 193 quilombos apresentaram algum tipo de problema na vacinação (43% dos casos monitorados)
– Em 54 quilombos foi relatado que quilombolas não residentes no território enfrentaram dificuldade no acesso à vacinação como grupo prioritário
– Em 6 quilombos foi relatada a dificuldade de vacinação de maridos, esposas e enteados não quilombolas residentes no território.
– 346 dos quilombos consultados ainda não são titulados
– 33 dos quilombos consultados não foram certificados pela Fundação Cultural Palmares

Problemas identificados:
– 193 quilombos apresentaram problemas na vacinação
– Principais problemas são:
* Quilombo não recebeu vacina por não ser certificado pela Fundação Cultural Palmares – 9 casos
* Cônjuges e enteados não quilombolas residentes no território não foram vacinados – 6 casos
* Dificuldade no planejamento e execução da vacinação – 69 casos
* Doses insuficientes – 24 casos
* Conflitos no município ou com outras comunidades não quilombolas pela não aceitação de quilombolas como grupo prioritário para a vacinação – 17 casos, em 11 casos foi relatado a tentativa de vacinar não quilombolas ou destinar a vacina reservadas para quilombolas para outros fins
* Dificuldades no acesso à vacinação como grupo prioritário de quilombolas residentes fora do território – 54 casos
* Recusa individual à vacinação – 54 casos

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