Com a chegada da estação quente e duas lâmpadas incandescentes de 20W a varanda dos fundos se transformou em paragem perfeita para a estadia das aranhas. E embora não sejam todas da mesma família ou espécie convivem bem, ainda que algumas teias estejam lado a lado. Através de uma constante observação percebi o quanto esses animais são respeitosos. Suas teias jamais se apinham umas sobre as outras. Mantêm sempre uma espécie de recuo entre as sedosas áreas construídas e se emitem algum ruído não incomodam ninguém além delas mesmas.
Sei que a época lhes é favorável. Insetos de todas as cores e tamanhos chegam desavisados, atraídos pela luz e se engalfinham nas teias para nunca mais darem notícia. Sagazes são as aranhas que desenvolveram técnicas para conservar seu alimento. Em todas as teias pequenas bolotas chamam a atenção: são os corpos protéicos dos insetos bem embrulhados, figurando como marmitas para o momento da pausa no trabalho.
Ah, e não pensemos que as teias sejam feitas ao léu! Elas respeitam uma geometria perfeita; bem alinhados os fios brilham na sequência que os reduz até o ponto central, onde tudo começou naquele projeto de construção aracnídeo. As aranhas trabalham. São vigilantes incansáveis. Sua teia é mais que sua casa, é sua própria vida. Por isso nem um fio fica fora do lugar.
Em todo caso, devo dizer, que o que mais me encanta é quando as vejo descer num suave rapel através de um fio. Vêm sem afobação, parando de quando em quando, girando sobre o próprio eixo até a altura da janela, quando não tiram os oito olhos e o olfato da situação que ocorre dentro da cozinha.
A ciência me desmentiria, mas posso jurar que elas gostam do cheiro do café vespertino. Pois é nessa hora que há sempre uma delas dependurada num fio brilhoso, demonstrando curiosidade e deleite.
Rafael Alvarenga
Escritor e professor de Filosofia
ninhodeletras.blogspot.com.br
