Namoradeira e mexeriqueira

A moça namoradeira é filha da mulher mexeriqueira. A namoradeira não gosta que a mãe mexerique e a mexeriqueira, por sua vez, não quer que a filha namore. E há quem goste de cada uma delas por razões óbvias e pessoais, o que divide as opiniões dos viventes e passantes.

Uma vizinha quer saber se o filho subiu em direção à praça; o carteiro, que é novo aqui, procura a rua Manoel Cordeiro de Lima; até um cão vadio e magricela encontra abrigo e proteção sob a janela da mulher mexeriqueira que não se isenta de dar uma informação e não admite covardia. Esses fazem partido da mulher mexeriqueira e dizem ainda: Não fosse a vaidade dos homens as suspeitas de adultério seriam resolvidas ali na janela com uma pergunta e duas respostas. É que a mulher mexeriqueira sabe mais que muita cartomante de saia rodada, tenda armada e bola de cristal. E bastaria uma consulta para o sujeito ao menos deixar de ser o último a saber, o que já lhe diminui a desvantagem do tempo.

Mas há o rapaz que chega vendendo picolé. Sabe ele que quem tem dinheiro é a mexeriqueira, mas, para a namoradeira ele oferece de graça. E fica envolto em uma conversa mole até que reste só o palito, que a moça vai jogar na lixeira lá dentro de casa. Também outro rapaz, o que não trabalha e procura sombra na varanda do bar, gosta da namoradeira. E quando é ela que preenche sozinha a moldura da janela ele se exibe com copo de cerveja preta e cigarro de filtro vermelho. Pensa que simbolizando a boemia seduzirá a namoradeira.

Enfim, há quem goste e quem não goste. O mundo é assim, tolera-se mais do que ama-se, mas, sobretudo, vivesse.

Rafael Alvarenga
Escritor e professor de Filosofia
ninhodeletras.blogspot.com.br

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