Dificuldades: do leite de João Lucas a ficar na mesma casa

casalO funcionário público Jaques Alves Viana, de 41 anos, foi até a Associação de Proteção à Infância e Maternidade de Resende (Apmir) nesta segunda-feira, dia 9, e tentou ter acesso ao prontuário da esposa, a a agente social do Cras Itapuca Jaqueline Nunes Nogueira, de 27 anos. Como resposta, ouviu que o documento só seria fornecido “por ordem de um juiz, de um delegado ou para o próprio paciente”, o que não é possível devido à morte de Jaqueline. Ela morreu no dia 2, horas após dar a luz no hospital e, para a família, foi vítima de negligência. Já o hospital alega que a agente social pode ter sido vítima do vírus da gripe H1N1. Enquanto isso, a família sofre com as dúvidas, o luto e as dificuldades financeiras, como relataram na terceira e última parte da entrevista exclusiva concedida ao jornal BEIRA-RIO.

Como estava com dificuldades de respirar e suspeita de ter contraído o vírus da gripe H1N1, Jaqueline não chegou a amamentar o filho após seu nascimento. No hospital ele recebeu um complemento ao leite, de nome Nan, e, após a morte da mãe, a família foi orientada a continuar fornecendo a bebida à criança.

– Eu já tinha ganhado uma mãe de leite depois que ela morreu, mas falaram que não era bom entrar com leite de nenhuma espécie porque com o vírus da gripe não se sabe e como ele está com a imunidade muito baixinha que era para dar o complemento. E ele está mamando igual não sei o quê – lembrou a mãe de Jaqueline, Maria Helena Nunes Nogueira, de 53 anos.

O problema é que cada lata do complemento custa cerca de R$ 40 e, como João Lucas está mamando a cada três horas, a lata dá para mais ou menos dez dias. As primeiras latas foram compradas pela família, mas com isso parte do dinheiro que seria usado em fraldas também foi revertido para o complemento.

– O pessoal da secretaria de Assistência Social, onde trabalho, está ajudando muito. Eles trouxeram várias latas. A Marcelle Bastos, do Niam, perguntou o que poderia doar, se estávamos precisando, e eu falei “tudo”. Sendo de coração a gente recebe de bem, Nan, fralda, até roupinha, porque ele ainda tem pouquinha – disse Jaques Viana, acrescentando que quem quiser fazer doações pode procurar a assistência social de Resende.

Durante a gravidez, ele gastou dinheiro também com obras. O casal morava em um apartamento na Cidade Alegria, mas quando soube que a mulher estava grávida, Jaqueline pediu para se mudarem para uma casa de três quartos. A casa, alugada de um tio dela, foi toda reformada para receber a criança. As paredes foram todas pintadas, por dentro e por fora, foi construído um murinho na porta para evitar que a criança fosse para o quintal enquanto estivesse engatinhando e Jaqueline fez uma horta no quintal. Já haviam plantado tomate e o feijão já tinha sido até colhido e preparado em uma refeição. Por isso, Jaques explicou que não tem mais condições emocionais de ficar no local.

– Para mim aqui não dá, lembro muito dela. A gente sentava no sofá e fazia planos, ficava no quintal fazendo planos. Tudo aqui estava do jeitinho que ela queria, tudo me lembra dela. Reformei do gosto dela, o pai dela ia arrumar o quintal para ela fazer a horta, todo dia ela vinha com a garrafinha e regava as plantas. Durante o dia tem sempre alguém me ligando, estou correndo atrás de alguma coisa, mas de noite, vou te falar que é difícil. No domingo ela estava com um casaco o dia inteiro e à noite eu deito do lado dela na cama e fico com o casaco. Meu chefe me falou que posso voltar a trabalhar quando quiser, mas já vou na segunda-feira porque não dá para ficar aqui, não. Vou procurar uma quitinete, um lugar pequeno e que não me traga tantas lembranças – comentou o motorista.

Jaqueline estava disposta a deixar o trabalho para se dedicar ao filho, enquanto o marido trabalharia para sustentar a casa, mas agora a família acatou a sugestão de Rosa, assistente social da Apmir, e o bebê vai ficar com os avós maternos. Por isso o berço já não está no quarto azul feito para ele, mas no quarto do pai até que os avós consigam espaço para ele.

– A Rosa (assistente social da Apmir) chamou e falou que só ia entregar o neném para os pais da Jaqueline com o marido e falou que tinha que ficar com eles. Ele vai morar com eles, mas venho aqui direto, continuam sendo meu sogro e minha sogra. Deus me deu os dois no momento mais difícil da minha vida, quando perdi meus pais, e eles me acolheram. Com minha irmã não tenho tanta intimidade desde que meus pais morreram, então sou uma pessoa sozinha, por isso considero eles minha família. Não tenho muito jeito com criança e eles têm mais. Mas posso vir a qualquer hora e pegar o menino quando quiser para passear – explicou Jaques.

Os pais de Jaqueline, Maria Helena e Arlindo Rodrigues Nogueira, de 66 anos, que já cuidam de outra neta, dizem que a criança é tranquila e não dá trabalho.

– Ele está muito esperto, já até vira. Não chora nada. Ontem tomou duas vacinas e na do braço nem chorou. A Rosa escreveu para nós o que tem que fazer, as vacinas que precisa tomar, exame do pezinho. Estamos fazendo tudo o que ela falou, ela está dando todo apoio. A gente ainda está trazendo as coisas dele aos poucos. E o Jaques pode vir aqui a hora que quiser. Já falamos para ele que não muda nada – disse Maria Helena.

Até esta terça-feira, dia 10, a Apmir não havia dado maiores explicações sobre o caso e nem procurado a família. Em nota, a Secretaria Municipal de Saúde de Resende informou que “o caso está sendo apurado pela Superintendência de Auditoria, Avaliação, Supervisão e Controle e pela Comissão de Investigação de Óbito Materno”. O secretário de Saúde, Daniel Brito Pereira, explicou que a auditoria vai investigar o fluxo de trabalho no dia do atendimento de Jaqueline e que solicitou à Central do Samu, em Volta Redonda, uma cópia da gravação do dia 2, pois a Apmir lhe disse que pediu a ambulância às 13h e ela só chegou às 15h30. O BEIRA-RIO tentou contato com o Samu, mas o coordendor não foi encontrado para confirmar se a gravação havia sido realmente solicitada e se já havia sido encaminhada.

 

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