QUEM PENSA? Cidadania! Palavra linda!

O texto abaixo é do saudoso sociólogo Herbert de Souza, o Betinho. No quarto parágrafo há uma referência ao que foi neste país um dos maiores problemas: a fome. E que teve como um dos maiores batalhadores o Betinho e também o ex-presidente Lula. Em fevereiro de 1993, quando se iniciava a “Ação da Cidadania”, Lula enviou ao então presidente Itamar Franco um Programa de Segurança Alimentar propondo a criação de um fórum de parceria entre o governo e a sociedade civil para discutir e combater a miséria. A proposta foi aceita e algumas medidas foram iniciadas, entre elas: elaboração e divulgação do “Mapa da Fome” pelo IPEA segundo o qual haveriam 32 milhões de pessoas no Brasil vivendo como indigentes em março de 1993; apresentação de um “Plano de Combate à Fome e à Miséria”, documento que sistematizava uma série de ações governamentais possíveis em abril de 1993; e criação do CONSEA, em abril de 1993, órgão consultivo ligado à Presidência da República, composto por 7 ministros de Estado e mais 21 representantes da sociedade civil.

Hoje graças a um governo que não abandonou essa ideia implantada há mais de 20 anos temos uma situação muito diferente daquela década de 90. Mas mesmo passados todos esses anos, existem aquelas pessoas muito mal informadas – prefiro acreditar que é falta de informação – que consideram o Bolsa Família, entre outras ações sociais, que dão atenção aos mais necessitados, política menor. Lamentável. Penso que buscar informação é o melhor caminho para garantir a cidadania, por isso trouxe hoje neste espaço a contribuição de Betinho.

“Não é por acaso que a palavra cidadania está sendo cada vez mais falada e praticada na sociedade brasileira. Uma boa onda democrática que vem rolando mundo afora chegou ao Brasil há algum tempo e tem nos ajudado a descobrir como dar conta do que acontece na vida pública.

Cidadania é a consciência de direitos democráticos, é a prática de quem está ajudando a construir os valores e as práticas democráticas. No Brasil, cidadania é fundamentalmente a luta contra a exclusão social e a miséria e mobilização concreta pela mudança do cotidiano e das estruturas que beneficiam uns e ignoram milhões de outros. E querer mudar a realidade a partir da ação com os outros, da elaboração de propostas, da crítica, da solidariedade e da indignação com o que ocorre entre nós.

Um cidadão não pode dormir com um sol deste: milhares de crianças trabalhando em condições de escravidão, trabalhadores sobrevivendo com suas famílias num quadro de miséria e de fome, a exploração da mulher, a discriminação do negro, uma elite rica esbanjando indiferença num mundo de festas e desperdícios escandalosos, de banqueiros metendo a mão no dinheiro do depositante, da polícia batendo em preto e pobre.

A fome é a realidade, o efeito e o sintoma da ausência de cidadania. O ponto de partida e de chegada das ações cidadãs. A negação radical da miséria é um postulado de mudança radical de todas as relações e processos que geram a miséria. É passar a limpo a história, a sociedade, o Estado e a economia. Não estamos falando de coisas abstratas, de boas intenções ou desejos humanitários de alguns.

Cidadania é, portanto, a condição da democracia. O poder democrático é aquele que tem gestão, controle, mas não tem domínio nem subordinação, não tem superioridade nem inferioridade. Uma sociedade democrática é uma relação entre cidadãos e cidadãs. É aquela que se constrói da sociedade para o Estado, de baixo para cima, que estimula e se fundamenta na autonomia, independência, diversidade de pontos de vista e, sobretudo, na ética – conjunto de valores ligados à defesa da vida e ao modo como as pessoas se relacionam, respeitando as diferenças, mas defendendo a igualdade de acesso aos bens coletivos.

O cidadão é o indivíduo que tem consciência de seus direitos e deveres e participa ativamente de todas as questões da sociedade. Um cidadão com sentido ético forte e consciência de cidadania não abre mão desse poder de participação”.

Grande Betinho.

Ana Lúcia
editora do jornal BEIRA-RIO
analucia@jornalbeirario.com.br

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