E você? É intolerante?

No começo desta semana, acessei as redes sociais e encontrei uma postagem compartilhada pela editora Ana Lúcia sobre a novela “Meu Pedacinho de Chão”, aquela mesma em que os cenários e figurinos ficaram mais lúdicos, atraindo crianças e adultos, diferente da primeira versão, exibida em 1971, pela mesma emissora de TV. Mas o que na verdade eu pretendo colocar neste texto não é uma crítica à novela muito menos à emissora que a produz, mas ao absurdo que foi postado em relação aos nomes das personagens, incitando a intolerância religiosa.

Eu sei que ao ler a postagem nas redes sociais, fiquei um tanto exaltada com isso. Mas me aprofundando no assunto, realmente não entendo de onde essa criatura que redigiu o texto tirou tanto argumento para dizer que a tal Vila de Santa Fé, local onde a história se passa, é um terreiro, e cada personagem tem base em algum nome da Umbanda, de uma forma que desmoraliza a quem escolheu esta religião para seguir. Como provar que Benedito Ruy Barbosa é umbandista e que estaria alienando os telespectadores? Pelo menos, a maioria felizmente não compartilha disso.

Como jornalista, defendo que toda informação deveria ter um mínimo de embasamento, mas isso não chega a ser a realidade teológica de várias igrejas, que se baseiam apenas na fé e nos ensinamentos da Bíblia para defenderem o que na visão deles é o mais correto, ou seja, em suas doutrinas. O problema é que a Bíblia foi escrita há mais de dois mil anos, em uma era da História da Humanidade onde os costumes ainda eram rudimentares, apesar de algumas semelhanças sociais com os dias de hoje.

Mesmo contando a história de Jesus de Nazaré, que pregou o amor entre o próximo, ao contrário dos ensinamentos dessa grande personalidade, muita coisa não se deveria mais aplicar em pleno Século XXI. Porém, alguns religiosos, não satisfeitos com o que eles acreditam ser a verdade deixada pela palavra de Deus nas escrituras sagradas, se acham “donos da verdade”, espalhando a intolerância em especial entre dois grupos que eu defendo arduamente, talvez pelo fato de valorizarmos (eu e parte da população do país) uma das festas mais populares brasileiras, o carnaval: o público LGBT (gays, lésbicas, travestis e trans) e os adeptos da Umbanda e do Candomblé.

No caso dos nossos amigos da diversidade sexual, eles querem impedir as conquistas obtidas pelo estado laico, e no caso dos que professam religiões afro-brasileiras – nosso principal foco aqui – fazem questão de usar até bandidos (como no caso de comunidades cariocas onde traficantes estariam proibindo a prática do candomblé depois de se converterem a igrejas evangélicas). Acreditem, esses fundamentalistas querem a aprovação no Congresso de uma emenda submetendo decisões do Legislativo e Executivo ao jugo de religiosos, a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 99/11 (apelidada de PEC do Fundamentalismo Religioso), de autoria do deputado federal goiano João Campos (PSDB) para que a situação fique ainda mais complicada.

A ação dessa minoria de fundamentalistas e bandidos um tanto é preocupante. No meu caso, que sou batizada na Igreja Católica, uma tradição na maioria das famílias brasileiras, e a minha é uma delas, impera o desconhecimento quanto à doutrina seguida por religiões de matriz africana, assim como entre meus parentes e amigos evangélicos. Infelizmente não podemos ignorá-las porque já fazem parte da nossa cultura desde os tempos da escravatura no Brasil, mas a sociedade de maioria católica e evangélica é falha e não se esforça para entender a doutrina de nossos irmãos de Umbanda e Candomblé, ao menos para a tolerância seja melhor pregada.

Ainda que pese o meu inconformismo com certas doutrinas religiosas, procuro respeitá-las. De vez em quando costumo debater essas questões com minha família ou com o namorado, mas nada que gere uma intolerância maior. Reconheço a revolta que tenho toda vez que vejo ou fico informada de alguma injustiça contra qualquer que seja a religião, mas procuro respeitar o credo de cada um. Afinal, qualquer uma delas tem bons e maus religiosos.

E pensando nisso, aproveito a oportunidade para convidar os nossos leitores para o I Encontro da Diversidade Religiosa, que acontece dia 25, a partir das 17 horas, no Espaço Z, com a participação de representantes de várias religiões que debaterão sobre a paz, elemento importante para o combate à intolerância religiosa. E tem mais, não tenham medo de assistir “Meu Pedacinho de Chão” porque ela não me assusta nem um pouco, e retrata a realidade do nosso povo brasileiro, ainda que em clima de conto de fadas. E que os fundamentalistas pensem mil vezes antes de sair falando qualquer coisa!

Loliza Domingues
Editora Assistente do jornal BEIRA-RIO

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