Caso Emilly e Rebecca: o drama das crianças vítimas de bala perdida no RJ

Atualizado às 17h21

Neste domingo, dia 6, moradores da comunidade do Barro Vermelho, em Duque de Caxias (Baixada Fluminense), e parentes de Emilly Victoria Silva dos Santos, de 4 anos, e sua prima Rebecca Beatriz Rodrigues dos Santos, de 7 anos, protestaram na Praça do Teatro Raul Cortez, no centro do município, pedindo o amparo por parte do estado às famílias e que a polícia reforme sua política de segurança (na foto ao lado).

As duas foram mortas na última sexta-feira, dia 4, quando estavam na calçada em frente a porta de casa, na comunidade, enquanto brincavam.  A mais nova foi baleada na cabeça e a outra na barriga. Ambas foram enterradas no sábado, dia 5.

Dezenas de pessoas compareceram à manifestação. Os manifestantes levaram cartazes com “Justiça por Emilly e Rebecca” e “Vidas negras importam”. Este bordão foi o mais entoado pelos manifestantes. A polícia está sendo acusada pelos disparos contra as meninas, mas esta tem negado a autoria do crime.

As mortes de Emilly e Rebecca engrossam a lista de estatísticas de entidades como a ONG Rio de Paz. De acordo com a organização, que acompanha casos de crianças mortas por armas de fogo desde 2007, somente no estado do Rio de Janeiro 79 crianças foram vítimas da violência, a maioria delas por balas perdidas. E neste ano, subiu para 12 o número de crianças mortas por armas de fogo (o equivalente a uma por mês), quase o dobro de 2019, quando sete crianças se tornaram vítimas fatais.

“Sempre que essas mortes ocorrem pensamos que tudo vai mudar, uma vez que a face mais hedionda da criminalidade no Rio é a morte por bala perdida desses meninos e meninas. Contudo, nada muda. Famílias permanecem desamparadas, a autoria dos homicídios não é elucidada, os assassinos não são punidos e nenhuma transformação ocorre na política de segurança pública. Vale lembrar que quem morre são crianças pobres. Nisso reside a razão da indiferença por por parte das autoridades públicas”, disse o presidente da ONG, Antonio Carlos Costa, em nota na página da entidade nas redes sociais.

Além do protesto de domingo, a mesma ONG também prestou uma homenagem às meninas. Uma coroa de flores foi colocada junto às placas com os nomes de Rebecca e Emilly no sábado, na Lagoa Rodrigo de Freitas, na zona sul da cidade, junto a outras de crianças mortas pela violência no Rio.

Dados do Instituto de Segurança Pública (ISP-RJ) vão de encontro com esse aumento nas estatísticas. As mortes por intervenção de PMs no estado quase triplicaram em outubro deste ano (chegaram a 145), se comparado ao mês anterior. Em setembro, essas mortes chegaram a 52. Esse aumento contraria o determinado pelo Supremo Tribunal Federal (STF), que desde junho, proibia operações policiais em comunidades do estado durante a pandemia do novo coronavírus.

Primas aguardavam avó de Rebecca para comprar um lanche quando foram baleadas

TESTEMUNHA RELATA PERSEGUIÇÃO CONTRA BANDIDO
Segundo os moradores, no momento em que as meninas foram baleadas, uma viatura da Polícia Militar teria passado no local e foram ouvidos barulhos de disparos. “Estava chegando do trabalho e saltei do ônibus. Eu escutei no mínimo dez disparos. O ônibus passou e a blazer estava parada e deu aquele arranco para sair. Ele parou em frente à rua e simplesmente efetuou os disparos”, disse Lídia Santos, avó de Rebecca e tia de Emilly, ao portal G1.

Os familiares não souberam informar se havia algum tipo de perseguição na hora. No entanto, uma testemunha informou que policiais em uma Blazer atiraram contra um bandido numa moto que, ao se deparar com a polícia, desembarcou do veículo e saiu correndo a pé. O motorista da moto também escapou. “Por que não perseguiu ao invés de atirar? O cara estava a pé e eles estavam de carro. A rua estava cheia de crianças. E foi perto delas. Dava para ver que na rua tinha muita gente. Depois, passaram de carro devagar e nem prestaram socorro”, disse a testemunha.

A Assessoria de Imprensa da Secretaria de Estado de Polícia Militar informou que, na noite de sexta-feira uma equipe policial do 15ºBPM (Duque de Caxias) estava em patrulhamento na Rua Lauro Sodré, altura da comunidade do Sapinho, quando disparos de arma de fogo foram ouvidos. Segundo a assessoria, “não houve disparos por parte dos policiais militares” e “os policiais já foram ouvidos na Delegacia de Homicídios da Baixada Fluminense e as armas deles foram apreendidas para perícia”.

DPRJ DARÁ SUPORTE PÚBLICO A FAMÍLIAS
A Defensoria Pública do Estado do Rio de Janeiro (DPRJ) informou na tarde desta segunda-feira, dia 7, que vai assistir juridicamente as famílias das meninas. O atendimento será feito pelo Núcleo de Defesa dos Direitos Humanos (Nudedh), que vai acompanhar as investigações para fornecer aos órgãos competentes subsídios para a ação penal visando a apuração da responsabilidade criminal dos envolvidos.

As famílias foram recebidas na manhã desta segunda-feira em reunião de acolhimento organizada pela Ouvidoria da DPRJ. Participaram também as comissões de Direitos Humanos da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) e da Alerj, além do movimento social Movimenta Caxias e da Anistia Internacional. Ao final do encontro, o defensor público-geral, Rodrigo Pacheco, também esteve com os familiares para prestar solidariedade.

Essa primeira reunião teve como objetivo conhecer as famílias, fazer o acolhimento e orientá-las sobre as informações que podem ajudar tanto a polícia quanto o Ministério Público a esclarecer o que aconteceu. O acompanhamento das famílias nas diligências na delegacia será feito pela Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) e a assistência psicológica pela Alerj.

– Vamos acompanhar o desfecho da investigação para também responsabilizar civilmente o Estado pela conduta de seus agentes. É mais um episódio trágico no cotidiano da população. Duas famílias destruídas pela violência institucional do Estado. Duas crianças que brincavam na porta de casa tiveram suas vidas ceifadas: essa dor jamais será estancada. Estamos solidários na busca pela Justiça e atuaremos sem poupar esforços para que a perda de vidas humanas não seja naturalizada – disse Carla Vianna, defensora do Nudedh.

Fotos: Reprodução/Redes Sociais

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