Potente temporal

No meio do dia o temporal chutou as portas do mundo e veio até as varandas das nossas casas. As pessoas fecharam as janelas e apagaram as luzes. Ainda assim, a chuva batia, queria entrar. Uivava lupina certa de que ali havia gente acuada. Até a campainha tocou. Mas ninguém podia ser anfitrião tão gentil, embora houvesse, dentro de cada casa, tanto lugar seco para receber aquela água toda.

E foi assim que o temporal, que por si mesmo já é potente, se enfureceu ainda mais. Milhões de casas e nenhuma a fim de acolhê-lo. Abandonado à frieza dos telhados, o céu rugiu feito um leão escriturando seu reinado. Os homens se resumiram a pedir ao dia que resistisse com luz e sol. As crianças se juntaram sentadas na cama como os bichos no ninho. As mulheres eram as únicas a demonstrar coragem. Buscaram rodos e panos e se puseram prontas para o corpo a corpo.

A primeira goteira apareceu na cozinha, ao lado do fogão que descansava após o almoço. Um balde resolveu, contudo o madeirame da janela, fiel ao tempo, não podia suportar tamanha energia. Foi uma água amarelada escorrendo pela parede, manchando e envergonhando a cal até então imaculada.

Quando a água entrou por debaixo da porta é que tudo se elevou a um nível de guerra. Infantaria e cavalaria todos com suas armar reunidas para não deixar o inimigo penetrar no castelo. Uma luta inglória! Contra um inimigo que só sucumbia diante daquilo que justamente era preciso proteger: tudo que estivesse seco.

Rafael Alvarenga
Escritor e professor de Filosofia
ninhodeletras.blogspot.com.br

Foto: Pixabay

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