Como se olhasse um espelho

A moça segura o celular como se segurasse um espelho. Passa a mão até as pontas dos cabelos se olha e olha as horas. Não tem encontro marcado, mas também não sabe quando um encontro será marcado. A moça não quer parecer mal se alguém vier e quiser marcar um encontro. Essa moça que segura o celular como se segurasse um espelho. Há muita gente no entorno, mas a moça olha mesmo para si mesma. Se ela não se apreciar quem é que vai apreciar ela mesma. Vem um vai outro. Só a moça é que não vai. Pois há o risco de ir e esquecer-se de cuidar que os cabelos estejam sempre no lugar. Mal dá tempo de olhar se alguém olha. Afinal, para a moça, o mais importante é estar bem quando alguém vier e quiser marcar um encontro.

E se demora é que ainda é hora de cuidar dos cabelos. Há cada vez mais gente no entorno. Mas a moça segura o celular como se segurasse um espelho. Sempre encontra o que tocar e retocar. Porque o encontro ainda não foi marcado e a moça não quer parecer mal se alguém vier e quiser marcar o encontro. Ela se apressa. Passa a mão até as pontas dos cabelos se olha e olha as horas. Pois e se um rapaz vier apressado e quiser encontrá-la agora mesmo? Terá que estar pronta, ainda que seja para dizer não. Terá que estar bem, pois o mais importante é estar bem quando alguém vier e quiser marcar um encontro.

Ah, essas moças que seguram o celular como se segurassem um espelho! Não adivinharam ainda que quem olha sabe não haver amor perfeito; mas nem por isso lhes procuram pelos defeitos.

Rafael Alvarenga
Escritor e professor de Filosofia
ninhodeletras.blogspot.com.br

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