Não tenho dúvidas de que faço parte de uma geração que não vai se aposentar

Não tenho dúvidas de que faço parte de uma geração que não vai se aposentar. Certamente vou diminuir o ritmo de trabalho, mas a aposentadoria é uma realidade que faz parte do passado e não do meu futuro. Não somente pelos programas de assistência do país que em nada valoriza quem tanto contribuiu, e vem mantendo uma política pobre e sem proteção, abandonando mesmo à míngua quem chega ao ocaso da vida. Também porque se formos pensar nas contribuições da nova geração, o governo vai à bancarrota nesse sentido. A juventude que é pessoa jurídica e que terceiriza seu trabalho não se preocupa com esse tipo de coisa. Preocupante. Entretanto, para esse momento, minha reflexão é em nível existencial.

Muitas pessoas com as quais convivo foram criadas para que o trabalho não fosse apenas um modo de sobrevivência, mas que desse significado à vida. Fomos ensinados que deveríamos amar o que se faz, buscar a realização pessoal – seja lá o que isso signifique – através de atividades laborativas, mas principalmente, que nosso valor estaria relacionado ao tipo de ofício que iriamos desempenhar.

Muitos de nossos pais não puderam escolher as profissões. Minha geração é de filhos cujas mães foram em sua esmagadora maioria donas de casa ou professoras. Pais trabalhadores, mas cuja formação ficou em nível de ensino médio e majoritariamente autodidata. Poucos foram os formados em cursos superiores. Nossos pais se aposentaram e esperaram pela hora de ficarem livres do trabalho com a ansiedade e alegria como se espera um presente de natal. Se tornaram velhinhos ociosos e dorminhocos, sem nada, nada mesmo para fazer.

Minha geração não vai saber lidar com todo esse ócio. Ela não se vê em casa lendo jornais ou jogando damas em praças públicas. Vamos lidar com o trabalho para sempre. Como manutenção da vida em todos os sentidos. Não há tristeza nisso. Ao contrário, vamos trabalhar pela nossa construção pessoal até quando aguentarmos. Nossa alma pede por ocupação que tenha significado.

Se nos reportarmos ao termo “previdência” encontraremos o significado de “previsão conjetural do futuro”, ou seja, o conjunto de todas as possíveis hipóteses das quais podemos lançar mão para, enfim, cuidarmos da nossa “melhor idade” – seja lá o que fizeram para que as pessoas pudessem pensar assim – sem depender de ninguém, além de nós mesmos. E nesse viés não reside somente a preocupação imprescindível com a verba para a subsistência, mas a preocupação com as ocupações que continuarão a dar significado para nossa existência como seres humanos plenos de possibilidades. Até o fim.

Ângela Alhanati
contato@angelaalhanati.com.br
Livre pensadora exercendo seu direito à reflexão

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