Sem investimento na segurança, violência em Resende é a maior em 20 anos

Polícia teve que realizar megaoperação para coibir ação de bandidos que fecharam comércio em Resende: cena era inimaginável há pouco tempo na cidade (Foto: Divulgação/PMERJ)

Um velho fantasma voltou a assombrar a população de Resende nos últimos cinco anos: a violência, que apresenta números ainda maiores que os do início dos anos 2000. A estatística do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), que mapeou os dados entre os anos de 2000 a 2019, mostra que a criminalidade na gestão de Diogo Balieiro superou os números do registrado na gestão de Eduardo Meohas, que governou entre 1997 e 2002, com uma taxa de 48% de casos somente no ano de 2018, contra 45% registrados no ano de 2002, considerado o recorde anterior entre os anos 2000.

Aliás, foi no ano de 2018 que o jornal BEIRA-RIO fez uma matéria alertando para o crescente número de homicídios (e tentativas). A estimativa era de que o mesmo ano tinha tudo para superar 2017 nas estatísticas. Na ocasião, segundo dados oficiais do Instituto de Segurança Pública do estado do Rio de Janeiro (ISP-RJ), somente nos primeiros meses daquele ano, foram 63 tentativas de assassinato, três vezes e meia a mais que na mesma época em 2017, quando 18 pessoas tiveram suas vidas ameaçadas.

E de fato, ao todo, foram contabilizadas 113 tentativas de assassinato em 2018, contra 50 do ano anterior. De janeiro a junho daquele ano, foram 28 homicídios, quase o dobro de casos registrados no mesmo período em 2017, quando ocorreram 16 assassinatos. No total, o ano de 2017 fechou com 42 assassinatos, enquanto que em 2018 esse número chegou a 59 mortes violentas.

Em 2019, o número de assassinatos teve uma queda momentânea (27 mortes), e voltou a subir entre os anos de 2020 e 2021, se aproximando do recorde de 2018 (50 e 51 mortes, respectivamente). Até setembro deste ano, o ISP registrou 35 mortes, mas esse número pode aumentar ainda mais. Em relação às tentativas de homicídio, mesmo abaixo do registrado no ano recordista, este número também passou a oscilar: em 2019, foram 62 tentativas, contra 52 registradas em 2020; 64 em 2021; e 41 até setembro deste ano.

Se em anos anteriores a violência se tornou a principal preocupação da gestão municipal nos primeiros anos do Século XXI, a atual situação parece não sensibilizar a gestão do prefeito Diogo Balieiro, uma vez que falta ao governo a elaboração (ou manutenção) de um Plano Municipal de Segurança Pública e a integração dos diversos setores da sociedade para o combate ao crime no município.

Ainda que disponha de um Conselho de Ordem Pública, não há participação efetiva da população. E o pior: o governo sequer participa das reuniões realizadas mensalmente pelo órgão, conforme apurado pela equipe do jornal BEIRA-RIO, que realizou uma pesquisa com os dados sobre os conselhos municipais, constatando algo que explica o porquê dessa falta de atuação.

Na página da Prefeitura de Resende, é perceptível que alguns desses conselhos seguem com a lista de seus membros desatualizada (alguns deles ainda estão com a relação dos conselheiros que atuavam em 2017, primeiro ano da gestão do governo de Balieiro). Entre as listas desatualizadas estão a do Conselho de Ordem Pública, que ainda tem publicada a relação dos membros do biênio 2017/2018. A lista, portanto, não inclui o nome dos atuais membros.

Outro detalhe para se atentar nessa mesma lista é que um dos conselhos que integravam o de Ordem Pública na ocasião, o Conselho Municipal de Políticas sobre Drogas (Comad), se encontrava e ainda segue desativado atualmente. Se no governo de José Rechuan, o Comad ganhou status de conselho deliberativo pra colaborar na questão do combate a violência relacionado ao abuso do álcool e outras drogas, após Balieiro assumir, o mesmo sequer voltou a se reunir, contribuindo para a falta de ações da crescente e flagrante criminalidade relacionada às drogas.

Ao observar a relação do secretariado, ainda que o nome de seu principal representante, César Laurindo, apareça nos boletins oficiais do município, o nome da Superintendência de Ordem Pública não aparece mais na lista de órgãos e secretarias do site, ao contrário de dois de seus órgãos subordinados, a Diretoria Geral de Defesa Civil e a Guarda Civil Municipal. Em um organograma disponível no site da Estrutura Organizacional do governo, a superintendência aparece subordinada à Secretaria de Governo, conforme a Lei 3.324/2017.

QUEDA DE INVESTIMENTOS NA DEFESA CIVIL E GUARDA MUNICIPAL
A queda de investimentos na área da segurança, em especial nos dois órgãos citados e subordinados à superintendência, é outro indício do descaso do atual governo municipal nos cuidados com a segurança local. Ainda nos dois primeiros anos de Balieiro, a Proposta Orçamentária para 2018 aprovada pela Câmara, a primeira de seu governo, em relação aos gastos, mostra que a segurança pública municipal começou a sofrer com um “desmonte orçamentário”.

Se comparado a setores essenciais como a saúde e a educação, e até mesmo ao setor cultural, enquanto estas tiveram recursos de mais de R$ 126 milhões, R$ 105 milhões e R$ 3 milhões, respectivamente, o investimento na segurança ficou em R$ 1.237.987. No orçamento, o policiamento teve o menor repasse dentro da superintendência (R$ 50 mil). O restante ficou para a Administração Geral (R$ 52.200), Defesa Civil (R$ 63.687) e a maior parte em informação e inteligência (R$ 1.072.100).

No mesmo levantamento feito para 2019, os investimentos ficaram ainda menores. Ainda que os recursos tenham aumentado na segurança pública (R$ 1.559.987), apenas irrisórios R$ 1 mil foram destinados ao policiamento, sendo a maior parte investida em informação e inteligência (os valores passaram para R$ 1.470.350).

Na proposta orçamentária para o ano seguinte, os R$ 1.784.900 de investimentos da pasta seguiram altos em informação e inteligência (R$ 1.600.700), enquanto os recursos de policiamento seguiram em R$ 1 mil e os da Defesa Civil caíram drasticamente de mais de R$ 24 mil (2019) para R$ 2 mil, e ampliando os aportes na Administração Geral para mais de R$ 181 mil. Nas propostas orçamentárias seguintes, incluindo o do próximo ano, os valores dos investimentos não foram especificados.

TRAFICANTES FECHAM COMÉRCIO EM REPRESÁLIA
Traficantes que atuam na região da Grande Alegria têm se beneficiado com essa inoperância do município. Após a morte de dois supostos membros de uma facção criminosa baleados por policiais militares em tiroteio no bairro Jardim Beira Rio no último sábado, dia 12, dois dias mais tarde, os “chefões da área” teriam determinado fechamento do comércio nos bairros da localidade, obrigando os agentes da PM a realizarem uma megaoperação na última segunda-feira, dia 14.

A ação, realizada na região da Grande Alegria, contou com apoio dos batalhões de Volta Redonda, Barra do Piraí e Angra dos Reis, mobilizando 60 agentes, 10 viaturas e cinco motos. Na ocasião, o comandante do 5° Comando de Policiamento de Área (CPA), Coronel Marcelo Malheiros, determinou a ocupação na região por tempo indeterminado para garantir segurança aos moradores e comerciantes.

A megaoperação contra as facções criminosas da Grande Alegria também apreendeu 71 pinos de cocaína, dois frascos de cheirinho da loló, 41 pedras de crack e seis de maconha, além de material do tráfico.

GOVERNO MEOHAS DEMONSTROU COMO REDUZIR VIOLÊNCIA
Esse fato contrasta com a forte atuação dessa pasta de uns 20 anos para cá. Na mesma matéria publicada em 2018 sobre o crescimento da violência, é citado que Resende experimentou essa mesma escalada da violência no início dos anos 2000. A percepção governamental, no entanto, foi bem diferente do que vem acontecendo hoje. Tanto que em 2002, preocupado com esse crescimento da criminalidade, o governo do então prefeito Eduardo Meohas (1997-2004) começou a elaborar o Plano Municipal de Segurança, lançado em maio de 2003, com o objetivo de impedir esse crescimento.

Para isso, contou com o levantamento de estatísticas realizadas por parte da ONG Viva Rio. O plano também incluía a adoção de outras medidas de segurança, dentre elas instalação de câmeras de segurança, capacitação da Guarda Municipal e das Polícias Civil e Militar, e a criação de um Conselho Municipal de Segurança Pública.

O esforço de Meohas surtiu efeito em pouco tempo. No ano de 2004, a ONG Viva Rio divulgou um novo levantamento apontando que a criminalidade havia diminuído no ano de 2003, em comparação aos quatro anos anteriores (entre 1999 e 2002), com quedas em quase todos os índices. Homicídios e tentativas, além de estupros, diminuíram. Ainda que não tenha conseguido atingir todas as metas com o plano, Meohas fechou o governo com um investimento de R$ 1,5 milhão não apenas na segurança, mas também em projetos sociais, o que ajudou a reduzir a violência.

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