Juiz federal determina suspensão de seleção do Incra para famílias do Irmã Dorothy

Desde o último dia 15, o Ciep recebeu algumas famílias para se inscrever na seleção do Incra (Foto: Divulgação)

O juiz federal Paulo Pereira Leite Filho aceitou o pedido de ação civil pública da Defensoria Pública da União (DPU) e determinou a suspensão do Edital 561/2021 do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra/RJ) que determinava a realização de um Projeto de Assentamento para a inclusão de famíllias no Irmã Dorothy, em Quatis. O Incra ainda pode recorrer da decisão.

O cadastramento para a seleção das famílias as serem assentadas vinha acontecendo desde o último dia 15, e o seu encerramento estava previsto para esta sexta-feira, dia 29, no Ciep 492, no bairro Nossa Senhora do Rosário, em Quatis, em dois horários: das 8 às 12h e das 14 às 18h. A seleção é voltada para a ocupação das 53 vagas existentes no local do assentamento.

Em sua decisão, o magistrado – lembrando que o criação do Projeto de Assentamento Irmã Dorothy aconteceu em 17 de setembro de 2015 – citou que “as famílias que se instalaram no referido assentamento”, e que “criaram expectativa de serem formalmente assentadas na área, passando ali a viver e a desenvolver atividades econômicas de subsistência, criando raízes naquele território e laços de companheirismo e de amizade”. E que o Incra não teria notificado algumas famílias a respeito a solicitarem a regularização da área ou promoverem a desocupação das terras.

Além disso, o juiz destaca que a autarquia publicou um edital neste ano para a seleção das famílias beneficiárias do Programa Nacional de Reforma Agrária sem agir com transparência e respeito com os atuais ocupantes da área, que “a princípio, não receberam orientação acerca do procedimento que seria adotado para a seleção das famílias beneficiárias, gerando insegurança na comunidade”.

A decisão, publicada no final da tarde desta quinta-feira, dia 28, foi comemorada pelo Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST/RJ), que divulgou um pouco mais tarde um boletim se pronunciando sobre o assunto. A entidade vê com preocupação a realização nos últimos dias do cadastramento previsto em edital publicado pelo Incra no mês de setembro, e que acontece cinco meses após a última visita promovida no dia 25 de maio por policiais federais e técnicos do Incra.

Segundo os representantes do MST, as famílias não teriam recebido informações sobre a publicação do edital com antecedência.

– Bom dia compas, informamos que ontem (terça-feira, dia 26) começou o processo de cadastramento das famílias do Assentamento Irmã Dorothy, em Quatis, existe uma real ameaça de despejo de famílias que fiquem de fora do edital e que isso ocasione um conflito agrário severo. Vamos reorganizar uma frente de luta para auxiliar na parte da comunicação para dar apoio aos companheiros e companheiras que estão no território – citou um dos participantes do grupo que defende o assentamento nas redes sociais, o Irmã Dorothy Resiste.

O procedimento adotado pelo Incra para a regularização dos assentamentos no país desde o ano de 2017 passou a ser motivo de preocupação tanto para o MST quanto para as famílias, que alegam não terem recebido informações sobre a publicação do edital com antecedência.

– No dia 14 de setembro conseguimos através do Movimento, pelo setor de Direitos Humanos, a informação que o edital referente a seleção de famílias do Assentamento Irmã Dorothy foi divulgado em vias públicas. Havíamos um combinado com a superintendência em dezembro do ano passado (época em que o assentamento recebeu a notícia da seleção) de que seríamos avisados com antecedência sobre o lançamento do edital. E, além disso, viria anteriormente fazer um espaço para tirar dúvidas sobre o mesmo. Nada disso foi feito – explica a coordenadora regional do MST, Edneia Pinto.

Uma vez tendo acesso ao edital, os integrantes do MST entraram com recurso na Justiça Federal, junto à DPU, pedindo a suspensão da seleção do Incra no dia 8 deste mês. Segundo Edneia, vários são os motivos que levaram a entidade a tomar tal decisão, dentre elas a falta de clareza de algumas cláusulas do edital, e também a possibilidade de haver uma grave injustiça contra as famílias, que há anos esperam pela regularização que nunca veio.

– Aqui já é um assentamento antigo (o Irmã Dorothy foi criado em 2004), sua regularização se deu antes dessa nova lei (que diz que toda terra desapropriada para fins de reforma agrária terá que passar pelo sistema de edital). Então as famílias já poderiam ter sido regularizadas, o que não ocorreu por uma lentidão do Incra. Não é justo as famílias terem que se sujeitar a passar por esse edital público, onde muitas poderão ser prejudicadas – acrescenta a coordenadora.

Outra preocupação, tanto de Edneia quanto de integrantes do MST são para a possibilidade de conflitos dentro do assentamento. “A gente se preocupa muito com os conflitos que poderão vir a ocorrer nessa área, com famílias de muito tempo embaixo de lona preta, de anos de luta por essa terra, terem que sair para outras famílias ocuparem, e que não participaram desse processo. Não que elas não mereçam, pois são também trabalhadores e precisam. Mas isso tudo gera um conflito muito grande, infelizmente, entre os trabalhadores, que serão os mais prejudicados”, lamenta.

A coordenadora ainda cita que as famílias seguem vivendo momentos de tensão, incertezas e muito medo desde que foram informados por representantes do Incra sobre a seleção prevista no edital. “Buscamos fazer bastante trabalho de base dentro do assentamento, no sentido de orientar as famílias para não desanimar, para continuar fazendo o que sempre fizemos e mostrar que queremos terra para plantar, morar e dela tirar nosso sustento, criar nossos filhos, fazer a solidariedade, que foi sempre nosso lema, principalmente nessa pandemia onde precisamos levar um alimento saudável à mesa de todas e todos. Estamos cada vez mais unidos, e seguindo com o lema ‘nenhuma família a menos'”, completa.

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