Cabo de guerra

A moça vinha pelo canto da rua. Lembrei-me do poeta falando da moça cheia de graça. Mas nessa crônica não é esse o caso. Não que a moça seja desprovida de qualquer graça. O fato é que o motivo da crônica não é a graça de moça alguma e sim a revolta da goiabeira.

Pois é, vinha a moça pelo canto da rua. O rosto alegre, as mãos soltas. Talvez cantarolasse uma canção do seu tempo. Certamente não se atentava para o que fazia quando arrancou uma folha verde da goiabeira plantada na calçada. E como aquilo chamou a atenção! A moça puxou e a goiabeira resistiu. O galho foi esticando a moça foi passando, sem soltar a folha verde do arbusto, até que no limite daquele cabo de guerra que ninguém sabia por que havia começado, a goiabeira sucumbiu e largou a folha entre o indicador e o polegar da moça que vinha pelo canto da rua.

A goiabeira ficou irritadíssima de modo que se mexia independente do vento. Afinal, que direito tinha a moça de lhe arrancar uma folha? E o que era isso agora, pensava o vegetal, última moda na cidade? Arrancar folha de árvore sem intenção de fazer xarope, chá ou coisa que o valha.

Bem que eu disse acima que o motivo da crônica não era a graça de moça alguma. Porque essa que vinha, depois da briga com a goiabeira, ficou sem graça. Subiu para a calçada, parou de cantarolar, fechou o rosto e procurou com o que ocupar as mãos. Se fosse por essa altura que o poeta lhe avistasse falaria da moça, não pela graça e sim pelo embaraço.

Rafael Alvarenga
Escritor e professor de Filosofia
ninhodeletras.blogspot.com.br

Você pode gostar

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

O limite de tempo está esgotado. Recarregue CAPTCHA.