Aprovado em concurso de Resende diz que não assumiu por preconceito

Felipe Leal Cruz fez o concurso para o cargo de agente de programas socioculturais e desportivos da Prefeitura de Resende em 2010. Foi aprovado em 12º lugar e embora tivessem sido disponibilizadas apenas oito vagas inicialmente, foi convocado para o trabalho. Na etapa de exames médicos diz que apresentou todos eles com resultados normais, mas acabou sendo considerado inapto durante a entrevista. É que ele fazia uso de um medicamento controlado contra a ansiedade, a Risperidona, e afirmou ser ex-usuário de maconha. Para Cruz, sua conclusão de inaptidão aconteceu por preconceito.

– Fui convocado em 2010 ainda, em outubro, e paguei os exames todos do meu bolso e eles estavam ok. Eles entregam uma ficha tipo entrevista para preencher e uma das perguntas é se tomamos medicamento controlado. Fui honesto e marquei que sim. Na entrevista ele perguntou qual, eu falei que era o Zargus, ele olhou em um livro, viu que era Risperidona, falou que era antipsicótico e que eu não deveria nem estar ali e foi super grosseiro – lembrou Felipe Cruz.

Ele explicou que fazia uso do medicamento para controlar a ansiedade e comentou que qualquer pessoa pode ter crises e fazer uso deste medicamento.

– Eu fazia uso de maconha como usuário recreativo e tive uma crise de ansiedade. Fui ao psiquiatra e ela me deu o medicamento para quebrar o uso e cessar a crise. Um surto psicótico agudo as pessoas podem ter por estresse, quando comecei a tomar o medicamento parei de ficar ansioso. Fui questionar e o médico pediu um laudo da médica que me atendia. Levei na mesma semana e ninguém quis me atender. Decidi entrar com processo administrativo pedindo para ser nomeado e incluí o laudo. Foram três processos administrativos ao todo – acrescentou.

O homem afirma que em momento algum foi examinado pelos médicos, que viam apenas o laudo de sua médica considerando-o o apto e mesmo assim  o  reprovavam. Ele então pediu ajuda a um advogado para acompanhar aquela que já era sua terceira tentativa de resolver  o problema amigavelmente.

– Quando paguei um advogado para acompanhar o processo administrativo, conseguiram uma junta médica.  Acho que já era o terceiro processo, em janeiro de 2013. Me examinaram pela primeira vez e disseram que eu estava assintomático. Os advogados da prefeitura pediram para descrever o que significava isso e descreveram que eu estava higiênico, vestido bem, não apresentava sintomas de problemas e tinha a fala organizada. Mesmo assim, mantiveram a posição e enrolaram o processo até 2014, quando finalizava a validade do concurso – lamentou.

Felipe Cruz, que atualmente está trabalhando com o pai, diz que já trabalhou em lojas e empresas após o episódio e que nunca teve problemas por ser usuário de Risperidona.  Ele inclusive chegou a estagiar na Prefeitura de Resende por seis meses, em 2015, durante a faculdade de Psicologia, e diz que em momento algum ouviu reclamações relacionadas à inaptidão e por isso acredita ter sido vítima de preconceito.

– Acho que foi preconceito tanto pela maconha como pela medicação, porque quem me classificou como inapto até hoje não conheço pessoalmente. É uma médica da secretaria de Saúde que pegou o nome da medicação, pesquisou na Wikipédia e anexou ao processo administrativo. Até hoje me sentia constrangido em tocar no assunto como se eu fosse o culpado, mas percebi que o culpado é o preconceito. Tem gente que toma antidepressivo para acordar e ansiolítico para dormir e não é julgado. Entrei com processo de danos morais contra a prefeitura para que não aconteça o mesmo com outras pessoas – declarou.

Em nota, a prefeitura de Resende disse apenas que ”o candidato foi considerado inapto no seu exame admissional (exame médico) para desenvolver e executar as atividades pertinentes ao cargo pretendido pelo mesmo. O exame estava previsto e exigido no edital do concurso”, mas não explicou os motivos de ele ter sido considerado apto a realizar o estágio e nem a demora alegada por ele na tramitação dos processos administrativos.

Felipe Cruz não é o único que teve que lidar com o preconceito na busca por um emprego. Roberto da Silva Santos, diretor da ONG Evoluir, que cuida da recuperação de dependentes químicos, diz que essa é a realidade dos atendidos pela entidade.

– É uma coisa muita velada, mas existe. Antes de fazer esse trabalho eu era empresário em lugares importantes e quando voltava a eles para pedir emprego para alguém ficavam me jogando de um lado para outro. Todos batiam nas minhas costas e não davam oportunidade. Devido ao trabalho que faço, mesmo quando ia pedir trabalho para alguém que não  era ex-usuário de drogas, eu não  conseguia. Também não vale contratar para ver a pessoa como “coitada”, ela tem suas capacidades. Por isso agora eu ajudo a fazer o currículo, preparo para a entrevista, mas não apareço – revelou Roberto Santos.

Ele percebeu a situação ao buscar emprego para um rapaz que havia se recuperado após  usar todo tipo de drogas e que atualmente tem um  cargo  importante em uma empresa de Resende.

– Ele era super qualificado e todos davam tapas nas costas, mas a vaga não saiu, por ele ser ex-usuário de drogas. Pedi para ele tirar o nível superior do currículo e começar de baixo. Ele foi conquistando tudo pouco a pouco. Hoje ele está casado, tem filho, carro, casa, anos de abstinência e por estar em um cargo de confiança ele tem ajudado outros a conseguir emprego. Depois disso soube que um colega que não quis arrumar emprego para ele contratou uma pessoa que não revelou ser usuária de drogas na entrevista. A pessoa o furtou e foi mandada embora. Se tivesse contratado o rapaz teria  um funcionário de confiança até hoje – detalhou.

Roberto acredita que o preconceito sofrido por dependentes químicos ou ex-dependentes não se reflete apenas no mercado de trabalho, mas na vida destas pessoas como um todo.

– Aqui muitos são capazes de dar a volta por cima, mas não dão chance. O dependente químico é uma pessoa que ninguém quer. A mídia sempre liga a violência às drogas, mas tem pessoas que moram nas ruas e são incapazes de roubar, e é possível encontrar agressividade em pessoas que não usam droga. A violência faz parte do ser humano. É preciso controlar as emoções para deixar a dependência química, a pessoa precisa se tornar uma boa pessoa, adquirir uma mudança social, se tornar mais crítica, mas isso as pessoas não percebem. E o empresário não quer problema, quer solução, se sabe que a pessoa tem uma  fraqueza vai  tentar evitá-la – avaliou.

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2 thoughts on “Aprovado em concurso de Resende diz que não assumiu por preconceito

  1. Todo mundo da cidade sabe que esse ai não bate bem. Pode ter conseguido passar na prova, mas seu comportamento é totalmente fora da caixinha. Tem que ter avaliação psiquiátrica sim para saber se o candidato tem condições de assumir o cargo porque senão só vai ter maluco no serviço público.
    Tá certo sim não deixar ele entrar. Só quem não conhece esse cara compra por um bom preço. (…).

  2. Wanessa, sabe quem era considerado “fora da caixinha” também?
    Gênios como Albert Einsten, Nikolas Tesla, Thomas Edison, Charles Darwin, Ludwig van Beethoven.
    Quem realmente não “bate bem”, é gente preconceituosa que se esconde atrás do anonimato para fazer crítica destrutiva.
    Se você afirma que “todo mundo da cidade” o conhece, é porque algum sucesso ele faz. Talvez seja isso que te incomoda. Procure um profissional da saúde mental, porque você não tá bem.
    Se cuida!
    Beijos!

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