QUEM PENSA? O que a gente faz numa hora dessas?

Essa semana me deparei com uma situação daquelas que apertam o coração e que nos deixa em dúvida sobre o que fazer para ajudar aqueles que parecem frágeis. Não temos informações sobre a estrutura social do município, faltam informações dos plantões de programas de assistência e quase sempre um desinteresse dos órgãos públicos.

Final de tarde, um senhor quase é atropelado na porta da minha casa depois que se desequilibra e cai. Regina, que ajuda a cuidar da minha casa, estava em final de expediente, indo pra casa quando assistiu a queda daquele velhinho. Ajudou o senhor e me chamou para tentar colaborar já que ele falava com muita dificuldades. O velhinho tinha cheio de cachaça e algum tempo depois ele admitiu que foi chamado por um vizinho para “tomar umas”. O vizinho o troxe do Paraíso até a rodoviária no Centro, beberam e algum tempo depois, cadê o vizinho? Foi embora e deixou o velhinho de 72 anos com um pedaço de cabo de vassoura sozinho.

Cambaleante, aquele senhor de olhos fundos na cor azul e cabeça branca tinha as mãos calejadas e lhe faltam todos os dentes. Pois bem, não chegou a se ferir mais resolvi chamar o Samu, e fui conversar com o senhor que com dificuldades falou que não queria voltar para casa porque seria maltratado pela família. Disse com aquela voz baixinha “Tenho muito aborrecimento. Muito mesmo”. Queria se internar num asilo e por isso tentava subir a ladeira anterior ao antigo prédio do Asilo, sem saber que não funciona mais ali esta entidade.

Por várias vezes me ofereci a levá-lo para casa e ele nem dizia o endereço para não correr o risco. Fui até a ONG Evoluir que funciona hoje no antigo asilo na tentativa de saber se poderia dar abrigo a ele naquela noite, mas lá não funciona como dormitório. O atendimento internato da ONG é em outro endereço. Quando informei ao senhor que tinha chamado a ambulância e que essa o levaria para o Hospital ele levanta cambaleante mais uma vez, “quero hospital não”.

Chegar a voltar a ligar para o Samu para cancelar a vinda da ambulância já que ele sem aparentes ferimentos da queda também se recusava ter um atendimento. Aquele momento que você respeita a opinião do idoso já cansado de não ser ouvido, sabe como é? Pois bem, avisei ao Samu que não precisava mais mandar a ambulância. Aliás, uma prática que precisamos ter com os serviços públicos: avisar que não precisamos para dar vez a outro. Voltei a conversar com o velhinho que por fim aceitou que o levasse para casa, quando entro em casa, tiro o carro da garagem e chega a ambulância do Samu. Acho que não deu tempo de avisar, problemas no rádio… realmente não procurei saber. Os atendentes de uma educação ímpar, uma gentileza de primeiro mundo e todo o cuidado com aquele velhinho que preservarei nome, o levaram para o Hospital de Emergência.

Poderia ter terminado aí meu envolvimento, mas realmente não me sentiria bem sem saber se ao chegar sem documentos, parentes e com o cheiro da bebida seria atendido como merece. Na dúvida, liguei para as assistentes sociais do Hospital que ficam lá no setor até às 19h. E mais uma vez, a gentileza, a educação e vontade de ajudar foram singulares e tive a certeza que ele seria bem atendido. A assistente social informou que em casos sem parentes é providenciada uma ambulância para levá-lo para casa e ela pessoalmente iria recebê-lo no pronto socorro, já que a ambulância deveria estar chegando.

Durante esse vai e vem, porque não teria coragem de fechar o portão e deixar o velhinho na rua lá sem assistência como também não teve a Regina que ficou até às 18h30 ao lado do senhor conversando e tentando convencê-lo a ir para casa, mandei mensagem para uma integrante do Conselho Municipal do Idoso relatando o caso e solicitando acompanhamento para este senhor, mas o que realmente apertou meu coração foi saber que outros velhinhos e velhinhas nas mesmas condições ou às vezes até piores não têm a assistência merecida dentro de casa e que perdem suas autonomia e direitos, muitos efetivamente só no papel.

Em Resende, os programas sociais não têm a divulgação que precisam ter. Não sabemos os telefones de plantão de assistentes sociais, conselho tutelar, ajuda funerária, socorro aos idosos, situação de perigo a moradores de rua ou dependentes químicos, maus-tratos de animais entre outros. Alguns mantém até esses telefones, mas não divulgam. Do que adianta? Dizem que os órgãos de Polícia tem. Tem nada. Por várias vezes solicitei telefone de plantão do conselho tutelar ao PM e nunca consegui. Na verdade, cabe ao poder público divulgar amplamente estas maneiras de assistência fora de um horário de expediente convencional. Tem gente que acredita que tudo é chamar a Polícia e não é.

O governo municipal que tanto gosta de se gabar de prêmios conquistados deveria com uma simples ação, que depende de decisão com olhar humanitário, criar uma grande rede de proteção às pessoas em situação de risco de vida como foi o caso desse velhinho. Enquanto isto não acontece, e não acredito que aconteça nesse governo que aí está, vamos tentando fazer aquilo que podemos e como podemos. Sem entregar na mão de Deus, por favor. Ele já tem muita preocupação. Vamos é colocar batatas quentes nas mãos do prefeito e dos vereadores que deveriam cuidar e muito bem das áreas sociais com denúncias ao MP, MPF, PF, Polícia, Papa, capeta, seja lá quem puder apertar esses que acreditam que somos apenas um número em dia de eleição. Chega de brincar com a vida das pessoas.

Ana Lúcia
editora do jornal BEIRA-RIO
analucia@jornalbeirario.com.br

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One thought on “QUEM PENSA? O que a gente faz numa hora dessas?

  1. Boa noite Ana!

    Parabéns pelo gesto nobre, é impressionante como pequenos gestos podem fazer uma grande diferença!

    Deus abençoe!

    Paz!

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